RECURSO – Documento:7044166 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA Apelação Nº 5004006-96.2023.8.24.0039/SC RELATOR: Desembargador LUIZ CÉZAR MEDEIROS RELATÓRIO Por refletir fielmente o contido no presente feito, adoto o relatório da r. sentença (processo 5004006-96.2023.8.24.0039/SC, evento 162, SENT1): "F. D. S. N., já qualificado, por sua Procuradora (evento 1, PROC2), propôs a presente AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS DECORRENTES DE OFENSAS EM REDES SOCIAIS em face de M. L. C., também qualificado, alegando, em síntese, que o autor é pessoa idônea, funcionário fixo de empresa regularizada, nunca possuiu nenhum fato desabonador em sua conduta, sendo extremamente respeitado por todos que o conhecem; que toda a família do autor sempre foi envolvida com religiosidade e estudos sobre preceitos das tradições de Matriz Africana como Umbanda e Quimbanda cultuadas há muito tempo no Brasil; q...
(TJSC; Processo nº 5004006-96.2023.8.24.0039; Recurso: recurso; Relator: Desembargador LUIZ CÉZAR MEDEIROS; Órgão julgador: ; Data do Julgamento: 19 de dezembro de 2006)
Texto completo da decisão
Documento:7044166 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Apelação Nº 5004006-96.2023.8.24.0039/SC
RELATOR: Desembargador LUIZ CÉZAR MEDEIROS
RELATÓRIO
Por refletir fielmente o contido no presente feito, adoto o relatório da r. sentença (processo 5004006-96.2023.8.24.0039/SC, evento 162, SENT1):
"F. D. S. N., já qualificado, por sua Procuradora (evento 1, PROC2), propôs a presente AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS DECORRENTES DE OFENSAS EM REDES SOCIAIS em face de M. L. C., também qualificado, alegando, em síntese, que o autor é pessoa idônea, funcionário fixo de empresa regularizada, nunca possuiu nenhum fato desabonador em sua conduta, sendo extremamente respeitado por todos que o conhecem; que toda a família do autor sempre foi envolvida com religiosidade e estudos sobre preceitos das tradições de Matriz Africana como Umbanda e Quimbanda cultuadas há muito tempo no Brasil; que desde que o pai do requerente faleceu (importante religioso lageano), a companheira do requerente, Senhora Gisele Padilha Berlande, foi designada responsável pela casa de religião da família dos mesmos e, com isso, manifesta sempre em redes sociais e publicamente tudo o que é pertinente sobre trabalhos e a religião que praticam; que o autor não possui relação com as redes sociais da companheira; que o requerido passou a desferir ataques verbais com ofensas contra o requerente e contra sua companheira; que tais ofensas são alvo de ação penal privada interposta pelo requerente e sua companheira; que sofreu dano moral causado com as difamações e afirmações caluniosas contra o requerente; que a companheira do requerente é conhecida como a Rainha da Quimbanda de Lages; que, de maneira irônica, ao postar vídeos ofendendo a companheira do requerente, o requerido utilizava do termo 'rainha', assim como, ao proferir ofensas ao requerente, o define como 'o marido da rainha', não utilizando seus nomes próprios; que, em 28/1/2023, com a intenção de denegrir a honra e a moral do requerente, o requerido iniciou as ofensas nas redes sociais; que a companheira do requerente foi acusada de subtração de medicamentos em seu local de trabalho, ocasionando busca e apreensão em sua residência, porém nada fora encontrado; que o requerido imputou falsamente o cometimento de um crime por parte do requerente, utilizando a expressão "imagine a rainha algemada dentro do carro da polícia enquanto o marido é enquadrado como cúmplice"; que tal inverdade causou grande dano moral ao requerente, uma vez que nem sua esposa fora presa ou algemada e muito menos o mesmo fora enquadrado ou acusado de qualquer delito, tanto sofre os fatos quanto sobre qualquer coisa; que a companheira do requerente fora chamada para depor, mas nunca algemada ou presa e o requerente nada tinha de relação com o procedimento; que o requerido, em mídia, exclama: "alguém chegar e encontrar o 'boy' da rainha no banheiro com o 'boy' do 'babá', se referindo a uma traição inexistente do requerente para com seu relacionamento e ofendendo-o que traíra sua esposa com outro homem, o que sendo o mesmo heterossexual causa-lhe imenso dano moral.
Após outras considerações que, por brevidade, ficam fazendo parte integrante do presente relatório, postulou a procedência dos pedidos.
Valorou a causa e juntou documentos (evento 1).
Decisão deferindo a gratuidade (evento 4).
Citado (evento 40), apresentou CONTESTAÇÃO e documentos (evento 41).
Réplica e documentos (evento 47).
Petição e documentos do requerido (evento 52).
Petição e documentos do autor (evento 57).
Manifestação do demandado (evento 62).
Decisão de saneamento e organização do processo, com a designação de audiência de instrução e julgamento (evento 65).
Na data aprazada, foram tomados os depoimentos pessoais do autor (evento 146, VÍDEO1) e do réu (evento 146, VÍDEO2), bem como inquiridas as testemunhas e informantes da parte autora: Gisele Padilha Berlande (idem, VÍDEO3), ouvida na qualidade de informante; Graciele Berlande Smolka (idem, VÍDEO4), ouvida na qualidade de informante; D. A. L. N. (idem, VÍDEO5), na qualidade de testemunha; A. M. H. D. S. (idem, VÍDEO6), na qualidade de informante; Simone Santos da Silva (idem, VÍDEO7), na qualidade de testemunha; F. A. V. (idem, VÍDEO8), na qualidade de testemunha, com apresentação de contradita, que restou rejeitada; M. C. M. (idem, VÍDEO9), na qualidade de informante. Na sequência, foram inquiridas as testemunhas do réu: E. P. V. (idem, VÍDEO10), na qualidade de testemunha; J. D. O. D. S. (idem, VÍDEO11), na qualidade de testemunha; e A. T. D. S. (idem, VÍDEO12), na qualidade de testemunha (evento 143).
Alegações finais e documentos do autor (evento 150).
Alegações finais do requerido (evento 159)".
Acresço que o Togado a quo julgou improcedentes os pedidos por meio da sentença cujo dispositivo segue transcrito:
"JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados por F. D. S. N., na presente AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS DECORRENTES DE OFENSAS EM REDES SOCIAIS proposta em face de M. L. C..
Condeno o autor ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios que fixo em 10% sobre o valor atualizado da causa".
Irresignado, F. D. S. N. interpõe apelação (processo 5004006-96.2023.8.24.0039/SC, evento 173, APELAÇÃO1), na qual alegou que "as postagens, embora não mencionassem o nome do Apelante diretamente, utilizavam-se de apelidos e contextos que o tornavam perfeitamente identificável em sua comunidade, imputando-lhe falsamente a condição de cúmplice em uma investigação policial e ofendendo sua honra com insinuações sobre sua orientação sexual e fidelidade conjugal".
Anotou, preliminarmente, que "a condição financeira de um cônjuge não impede o outro de obter o benefício da gratuidade de justiça, e, frise-se, ainda, que as despesas do processo são obrigação da parte e não de seu cônjuge. [...] requer-se a reforma da sentença neste ponto, para restabelecer o benefício da justiça gratuita ao Apelante, uma vez que será impossível arcar com as custas processuais e despesas a que fora condenado".
No mérito, sustentou que "nas mídias anexadas aos autos a quo (ev. 1 e ev. 47), o apelado exclama: “alguém chegar e encontrar o ‘boy’ da rainha no banheiro com o ‘boy’ do ‘babá”, se referindo a uma traição inexistente do requerente para com seu relacionamento e ainda mais grave, ofendendo-o que traíra sua esposa com outro homem o que sendo o mesmo heterossexual causa-lhe sim, grande constrangimento sem tornar vexatória a opção sexual do apelado. O requerido imputou falsamente o cometimento de um crime por parte do requerente, utilizando a expressão “imagine a rainha algemada dentro do carro da polícia enquanto o marido é enquadrado como cúmplice”, fato nunca ocorrido. As testemunhas e informantes arroladas pela parte autora confirmam que a com a forma de falar o apelado deixou bem claro que se tratava do autor e de sua ex-companheira e não de pessoa indeterminada".
Asseverou que "não ofendeu ou considera que a homossexualidade do Apelado seja pejorativa. O que passou-se a instrução processual toda buscando foi o direito de não ter a sua opção sexual menosprezada e utilizada para atribuição de uma infidelidade a qual nunca existiu. O Apelante nunca traiu sua ex companheira, seja com outra mulher ou com homem, assim como não fez parte de qualquer investigação pela qual a mesma tenha passado, e isto foi claramente insinuado e propagado pelo Apelado de forma a todos que visse entendessem de quem estava falando.
Destacou que "o que se reputa ofensivo não é a orientação sexual em si, jamais desonrosa, mas a atribuição mentirosa de uma traição, divulgada em redes sociais com intuito de ridicularizar o Apelante, assumidamente heterossexual. A pecha de infidelidade, notadamente em comunidade pequena, é suficiente para abalar sua reputação, independentemente da forma como foi apresentada".
Ao final, requereu o provimento do recurso para reformar a sentença e "restabelecer o benefício da justiça gratuita ao Apelante, cancelando-se as custas e encargos gerados, subsidiariamente, que seja concedido nesta instância recursal, conforme situação financeira do Apelante; julgar procedentes os pedidos da inicial, condenando o Apelado ao pagamento de indenização pedida por danos morais ou, em valor justo e razoável, a ser arbitrado por Vossas Excelências, considerando a gravidade das ofensas e a capacidade econômica das partes, caso julguem em valor menor ao requerido; inverter os ônus sucumbenciais, condenando o Apelado ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, a serem fixados em valor percentual ao valor da causa".
Intimada, a parte apelada apresentou contrarrazões (processo 5004006-96.2023.8.24.0039/SC, evento 182, CONTRAZAP1), pugnando pela manutenção da sentença, com o que os autos ascenderam a esta Corte para julgamento.
VOTO
1 Presentes os pressupostos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade recursal, o reclamo merece ser conhecido, passando-se, desta forma, à respectiva análise.
1.1 O apelante postula a reforma da sentença no tocante à revogação da justiça gratuita.
Sem razão.
A revogação da benesse deve ser mantida, pois além de não haver elementos no caderno processual que revelem, propriamente, insuficiência de recursos, o recorrente procedeu ao recolhimento do preparo recursal, ato que, como cediço, é incompatível com a alegação de carência financeira, ainda que alegue tenha emprestado de terceiros o montante.
Nesse sentido:
"AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. ACIDENTE DE TRÂNSITO. REVOGAÇÃO DA JUSTIÇA GRATUITA CONCEDIDA À AUTORA E DEFERIMENTO DA BENESSE À RÉ. RECURSO DA DEMANDANTE
DECLARAÇÃO DE HIPOSSUFICIÊNCIA. PRESUNÇÃO RELATIVA DE VERACIDADE. REQUERENTE QUE, APESAR DO ACIDENTE DE TRÂNSITO SOFRIDO, CONTINUA EXERCENDO A FUNÇÃO DE ADVOGADA, ALÉM DE AUFERIR PROVENTOS DE APOSENTADORIA. ACERVO PATRIMONIAL FORMADO POR CERCA DE 20 IMÓVEIS, DOIS VEÍCULOS E APLICAÇÕES FINANCEIRAS. DESFAZIMENTO DO PATRIMÔNIO, PARA CUSTEAR SEU TRATAMENTO DE SAÚDE, NÃO DEMONSTRADO. AUSÊNCIA DE PROVAS A RESPEITO DE DIFICULDADES FINANCEIRAS ENFRENTADAS. ADEMAIS, RECOLHIMENTO DO PREPARO RECURSAL QUE É ATO INCOMPATÍVEL COM O PEDIDO DA JUSTIÇA GRATUITA. FALTA DOS PRESSUPOSTOS LEGAIS PARA A CONCESSÃO DA BENESSE. INTELIGÊNCIA DO ART. 99, § 2º, DO CPC. JUÍZO A QUO QUE DEFERIU A GRATUIDADE DA JUSTIÇA À RÉ. EMPRESA EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL. IMPOSSIBILIDADE DE ARCAR COM OS CUSTOS DO PROCESSO, SOB PENA DE PREJUÍZO ÀS SUAS ATIVIDADES. PRECEDENTES DESTE SODALÍCIO, INCLUSIVE DESTA CÂMARA. DECISÃO MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO" (AI n. 4032201-07.2018.8.24.0000, Desª. Cláudia Lambert de Faria) [sem grifos no original].
"PROCESSUAL CIVIL - JUSTIÇA GRATUITA - RECOLHIMENTO DO PREPARO - PRECLUSÃO LÓGICA
O recorrente que pleiteia a reforma da decisão de origem, em que se indeferiu o pedido de assistência judiciária gratuita por ela formulado, mas, ao mesmo tempo, quita o preparo, pratica ato incompatível com o pedido manifestado, ensejando o reconhecimento da preclusão lógica" (AC n. 5004701-57.2020.8.24.0006, desta relatoria).
É de rigor, portanto, a manutenção da revogação da benesse.
1.2 No mérito, melhor sorte não socorre ao apelante.
Inicialmente, impende salientar que o Código Civil prevê a possibilidade de indenização por danos morais causados por injúria, difamação ou calúnia, nos seguintes termos:
"Art. 953. A indenização por injúria, difamação ou calúnia consistirá na reparação do dano que delas resulte ao ofendido".
Contudo, é certo que a alegação de ter sido vítima de difamação, injúria ou calúnia depende da prova, pela parte autora, de que o ofensor tenha agido com dolo ou culpa.
Nesse sentido:
"APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. IMPUTAÇÃO DE FATO CRIMINOSO A OUTREM (CALÚNIA). AUSÊNCIA DE PROVA DO ILÍCITO. RECURSO DESPROVIDO.
Se o autor fundamenta seu pedido na ocorrência de ofensa, cumpre-lhe o ônus da prova acerca do fato constitutivo de seu direito, na forma do art. 333, inciso I, do Código de Processo Civil. Não se desincumbindo dessa obrigação processual, a improcedência se impõe" (AC n. 2003.011339-8, Des. Henry Petry Junior).
A respeito da obrigação de indenizar, preconiza o Código Civil:
"Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.
[...].
"Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.
"Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem".
Da leitura dos dispositivos acima, é possível afirmar que a caracterização da obrigação de indenizar, como regra geral, depende da satisfação de quatro requisitos indispensáveis, quais sejam, a conduta, o dolo ou a culpa, o nexo de causalidade e o dano.
Nesse sentido, restará configurada a responsabilidade civil subjetiva quando se verificar a ocorrência de efetivo prejuízo, patrimonial ou extrapatrimonial, decorrente de comportamento culposo voluntário de outrem, comissivo ou omissivo, que seja contrário ao ordenamento (antijurídico).
Acerca dos elementos da responsabilidade civil, ensina Flávio Tartuce:
"Sendo o ato ilícito, conforme já assinalado, o conjunto de pressupostos da responsabilidade, quais seriam esses pressupostos na responsabilidade subjetiva? Há primeiramente um elemento formal, que é a violação de um dever jurídico mediante conduta voluntária; um elemento subjetivo, que pode ser o dolo ou a culpa; e, ainda, um elemento causal-material, que é o dano e a respectiva relação de causalidade. Esses três elementos, apresentados pela doutrina francesa como pressupostos da responsabilidade civil subjetiva, podem ser claramente identificados no art. 186 do Código Civil, mediante simples análise do seu texto, a saber:
"a) conduta culposa do agente, o que fica patente pela expressão 'aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imperícia';
"b) nexo causal, que vem expresso no verbo causar; e
"c) dano, revelado nas expressões 'violar direito ou causar dano a outrem'.
"Portanto, a partir do momento em que alguém, mediante conduta culposa, viola direito de outrem e causa-lhe dano, está-se diante de um ato ilícito, e deste ato deflui o inexorável dever de indenizar, consoante o art. 927 do Código Civil. Por violação de direito deve-se entender todo e qualquer direito subjetivo, não só os relativos, que se fazem mais presentes no campo da responsabilidade contratual, como também e principalmente os absolutos, reais e personalíssimos, nestes incluídos o direito à vida, à saúde, à liberdade, à honra, à intimidade, ao nome e à imagem" (Programa de Responsabilidade Civil. São Paulo: Atlas, 2015, p. 35-36).
Sob essa perspectiva, forçoso concluir que, para ser a parte ré obrigada a indenizar o prejuízo alegado pela autora, deve esta comprovar no decorrer do trâmite processual a presença dos citados requisitos legais que, no caso em apreço, não estão demonstrados.
As provas constantes dos autos, conforme muito bem aduziu o Juízo a quo, demonstram claramente a ausência de identificação dos envolvidos nas postagens, além da inexistência de descrição de conduta criminosa ou ofensiva. O que há sim é um atrito, de há muito existente, entre a companheira do autor e o requerido, o que supostamente provocou a alteração nos ânimos e propiciou o ajuziamento da presente demanda.
1.3 Por concordar inteiramente com os argumentos bem lançados pelo doutor Alexandre Karazawa Takaschima, na sentença apelada, adoto-os como parte de minhas razões de decidir:
"É incontroversa a existência do conflito entre o autor e sua companheira em face do requerido, possuindo todos a mesma religiosidade de Matriz Africana.
O primeiro ponto controvertido é sobre a liberdade de expressão de opinião sobre as pessoas identificadas por 'rainha' e 'marido da rainha' nas postagens nas redes sociais realizadas pelo demandado.
Observo que não há identificação de quem seria a 'rainha' ou o 'marido da rainha', isto é, que a 'rainha' seria a Sra. Gisele Padilha Berlande e o 'marido da rainha' o autor.
A prova testemunhal divergiu sobre a possibilidade de identificação na postagem, tendo as informantes Sra. Gisele Padilha Berlande (evento 146, VÍDEO3), Sra. Graciele Berlande Smolka (evento 146, VÍDEO4), Sra. A. M. H. D. S. (evento 146, VÍDEO6), Sra. M. C. M. (evento 146, VÍDEO9) e as testemunhas Sra. D. A. L. N. (evento 146, VÍDEO5), Sra. Simone Santos da Silva (evento 146, VÍDEO7) e Sra. F. A. V. (evento 146, VÍDEO8), dito que a companheira do autor é a Mãe de Santo Sra. Gisele Padilha Berlande, conhecida como "Rainha", confirmando a existência de conflito entre a companheira do autor e o requerido, enquanto que a testemunha Sr. E. P. V. (evento 146, VÍDEO10), também confirmou a existência do conflito, porém que a expressão 'rainha', nas religiões de Matriz Africana, não deve estar relacionada a uma pessoa, mas associada à divindade materna e protetora.
A testemunha Sra. J. D. O. D. S. (evento 146, VÍDEO11, a partir da minutagem 14'45'') também confirmou o conflito e a questão criminal envolvendo a companheira do autor, afirmando que teve conhecimento dos vídeos objeto da presente ação, mas seriam vídeos aleatórios e sem identificação das pessoas referidas.
A testemunha Sr. A. T. D. S. (evento 146, VÍDEO12, a partir da minutagem 05'40''), também confirmou o conflito entre a esposa do autor e o requerido, mas não associou a postagem ao requerente, por ser o requerido jornalista, acreditando se tratar de fato ocorrido na cidade.
É fato incontroverso que os vídeos objetos da presente ação não mencionam os nomes do autor ou de sua companheira (Sra. Gisele Padilha Berlande), havendo controvérsia sobre a possibilidade de identificação do requerente.
É o entendimento:
DIREITO CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. DIVULGAÇÃO DE IMAGEM DE VEÍCULO EM GRUPO DE WHATSAPP. IMPUTAÇÃO DE CRIME. AUSÊNCIA DE PROVA DE DIVULGAÇÃO EM REDE SOCIAL ABERTA, IDENTIFICAÇÃO NOMINAL OU VISUAL DO AUTOR. DANO NÃO COMPROVADO. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.
I. CASO EM EXAME
1. Apelação cível interposta contra sentença que julgou improcedente o pedido de indenização por danos morais e materiais, decorrente da alegada exposição indevida de imagem do veículo do autor em rede social, após identificação de nota falsa apresentada em casa lotérica.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
2. Há quatro questões em discussão: (i) aferir se houve divulgação de imagem do autor e imputação de fato criminoso em rede social de acesso público; (ii) verificar a existência de dano moral indenizável decorrente da suposta publicação; (iii) apurar a responsabilidade civil do requerido; (iv) analisar o cabimento de indenização por danos materiais decorrentes do fato.
III. RAZÕES DE DECIDIR
3. A responsabilidade civil por ato ilícito exige a comprovação de conduta voluntária, dano e nexo causal, nos termos dos arts. 186 e 927 do Código Civil.
4. O conjunto probatório não demonstrou a publicação de conteúdo ofensivo em rede social aberta, tampouco houve identificação nominal ou visual do autor.
5. A fotografia do veículo foi divulgada apenas em grupo de WhatsApp restrito, voltado à segurança comunitária, fato admitido pelo próprio requerido na contestação.
6. O autor não produziu prova de abalo psicológico concreto, nem compareceu à audiência de instrução, inviabilizando a colheita de elementos subjetivos da alegada dor moral.
7. A jurisprudência afasta o dever de indenizar nos casos em que o dissabor não é intenso ou duradouro, a ponto de interferir na estabilidade emocional do indivíduo.
IV. DISPOSITIVO E TESE
8. Recurso conhecido e desprovido.
Teses de julgamento: "1. A divulgação de fotografia de veículo, sem menção ao nome ou imagem do titular, em grupo fechado de WhatsApp voltado à segurança comunitária, não configura violação à honra ou imagem a ensejar reparação civil. 2. O dano moral e material não se presume e deve ser comprovado de forma concreta, especialmente quando ausente imputação penal direta e quando o autor não colabora com a instrução probatória".
__________
Dispositivos relevantes citados: CC, arts. 186 e 927; CPC, arts. 373, I.
Jurisprudência relevante citada: TJSC, Apelação Cível n. 0312484-37.2015.8.24.0023, Rel. Des. Robson Luz Varella, Segunda Câmara de Direito Comercial, j. 23.06.2020.
(TJSC, Apelação n. 5000726-62.2019.8.24.0135, do , rel. Luis Francisco Delpizzo Miranda, Segunda Câmara Especial de Enfrentamento de Acervos, j. 10-07-2025). (Grifei)
Por outro lado, o segundo ponto controvertido é sobre a ofensividade dos conteúdos.
Alega o autor ter sofrido dano moral (evento 1, VÍDEO8 e VÍDEO9), pois o requerente, em uma postagem nas redes sociais, diz:
"Eu acordei hoje pensando. Imagine a rainha, algemada, dentro do carro da polícia, enquanto o marido é enquadrado como cúmplice. Imaginem só a cena da rolha de poço."
Tais fatos estariam relacionados à uma operação policial (busca e apreensão) envolvendo procedimento criminal contra a companheira do postulante.
Além da ausência de identificação sobre quem o requerido estava se referindo, observo que não se trata de calúnia, pois não imputou fato definido como crime, isto é, não descreveu uma conduta criminosa (art. 138, CP) e também não se trata de difamação, pois não se trata de fato (conduta) ofensiva, conforme determina o art. 139, CP. A narrativa de imaginar o "marido da rainha" investigado como cúmplice, salvo melhor juízo, não caracteriza injúria (art. 140, CP) ou como ofensiva a dignidade ou o decoro, tratando-se, salvo melhor juízo, de liberdade de expressão, nos termos do art. 5º, IV, da CF/88.
Em relação à segunda postagem (evento 1, VÍDEO7), no vídeo produzido pelo requerido, o mesmo diz, verbis:
"(...) alguém chegar e encontrar o "boy da rainha", no banheiro, com o "boy do babá". Direto do túnel do tempo."
Apesar dos argumentos apresentados pelo autor, entendo que não se trata de fato ofensivo à honra, pois a eventual traição não é juridicamente relevante para causar dano moral, já tendo o excelso Supremo Tribunal Federal (STF) reconhecido, no ramo do direito penal, a inconstitucionalidade da legítima defesa da honra na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 779.
Vale ressaltar que o ramo do direito das famílias não reconhece a traição, por si só, como gerador de dano moral, especialmente considerando que o autor continua com o seu relacionamento conjugal com a companheira Sra. Gisele Padilha Berlande, demonstrando que eventual imputação de traição não gerou abalo anímico no presente caso.
Já decidiu o egrégio TJSC:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. CONFISSÃO DE ADULTÉRIO PELO RÉU. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. RECURSO DO RÉU. PRETENSO AFASTAMENTO DO DEVER DE INDENIZAR. SUBSISTÊNCIA. CONJUNTO PROBATÓRIO INSUFICIENTE A ENSEJAR A RESPONSABILIDADE CIVIL DO RÉU. TRAIÇÃO QUE, POR SI SÓ, NÃO GERA INDENIZAÇÃO AO EX-CÔNJUGE. SENTIMENTOS DE TRISTEZA E ANGÚSTIA QUE SÃO PRÓPRIOS DE CIRCUNSTÂNCIAS ANÁLOGAS. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DE SITUAÇÃO EXCEPCIONAL ADVINDA DOS ACONTECIMENTOS. ENTENDIMENTO PACÍFICO DA JURISPRUDÊNCIA. AUTORA QUE NÃO SE DESINCUMBIU DO ÔNUS DE PROVAR O FATO CONSTITUTIVO DE SEU DIREITO. DEVER DE INDENIZAR NÃO CONFIGURADO. SENTENÇA REFORMADA. REDISTRIBUIÇÃO DOS ÔNUS SUCUMBENCIAIS. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. "A violação ao dever de fidelidade não gera, por si só, dano moral. Àquele que reclama compensação pecuniária pelo dano moral cumpre não só provar a infidelidade, mas também a ocorrência de uma conduta pública indiscreta, geradora de grave violação à dignidade do cônjuge/companheiro; de comportamento que 'cause sofrimento, vexame e humilhação intensos, alteração do equilíbrio psicológico do indivíduo, duradoura perturbação emocional'" (TJSC, Apelação Cível. n. 0000001-13.2014.8.24.0046, rel. Des. Newton Trisotto). (TJSC, Apelação Cível n. 0303285-05.2017.8.24.0125, de Itapema, rel. Rubens Schulz, Segunda Câmara de Direito Civil, j. 06-08-2020).
Por fim, admitir que a homossexualidade supostamente imputada ao requerente seja considerada como ofensiva à honra viola o fundamento constitucional da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, CF/88), pois o Estado e a sociedade não podem interferir na individualidade de ser das pessoas e seria manifestamente homofóbico, em confronto com a Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO) n. 26, do e. STF, porquanto pressupõe a equivocada ideia de eleger a heterossexualidade como o padrão honroso de ser na orientação sexual.
Destaco que a hipótese é peculiar, haja vista ter o requerido também a mesma orientação sexual imputada como ofensiva ou desonrosa, demonstrando que a homossexualidade jamais poderá ser considerada como pejorativa". (processo 5004006-96.2023.8.24.0039/SC, evento 162, SENT1).
Não há mais o que se acrescentar à brilhante fundamentação.
2 Em obediência ao art. 85, §§ 2º e 11, do Código de Processo Civil, fixam-se honorários recursais em favor do patrono da parte apelada em 2% (dois por cento) do valor da causa, os quais, cumulativamente com os 10% já arbitrados em primeiro grau de jurisdição, perfazem um total de 12% (doze por cento).
A majoração se justifica, não somente por atender ao preceituado na novel legislação processual civil quanto ao balizamento para a fixação dos honorários advocatícios, mas principalmente porque a insubsistência dos argumentos recursais motivou o desnecessário acréscimo de trabalho da parte recorrida.
3 Ante o exposto, voto por conhecer do recurso, negar-lhe provimento e majorar os honorários advocatícios para 12% do valor atualizado da causa.
assinado por LUIZ CÉZAR MEDEIROS, Desembargador, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7044166v11 e do código CRC 9d66aad8.
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Signatário (a): LUIZ CÉZAR MEDEIROS
Data e Hora: 12/11/2025, às 20:27:03
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Documento:7044167 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Apelação Nº 5004006-96.2023.8.24.0039/SC
RELATOR: Desembargador LUIZ CÉZAR MEDEIROS
EMENTA
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO CIVIL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS DECORRENTES DE OFENSAS EM REDES SOCIAIS. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. DESPROVIMENTO DO RECURSO DO AUTOR.
I. CASO EM EXAME:
Ação de indenização por danos morais ajuizada por autor que alegou ter sido ofendido em redes sociais por publicações do réu, as quais, embora não mencionassem seu nome, utilizavam expressões e contextos que o tornariam identificável, imputando-lhe falsamente a condição de cúmplice em investigação criminal e insinuando traição conjugal. A sentença julgou improcedentes os pedidos, revogando a gratuidade de justiça anteriormente concedida ao autor e condenando-o ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios.
II. QUESTÕES EM DISCUSSÃO:
(1) Possibilidade de restabelecimento da gratuidade de justiça ao autor;
(2) Existência de elementos que comprovem a identificação do autor nas postagens questionadas;
(3) Configuração de dano moral decorrente das postagens;
(4) Existência de conduta ilícita por parte do réu apta a ensejar responsabilidade civil.
III. RAZÕES DE DECIDIR:
(1) Inexistência de elementos que comprovem a hipossuficiência financeira do autor, sendo o recolhimento do preparo recursal incompatível com o pedido de gratuidade de justiça;
(2) Ausência de identificação nominal ou visual do autor nas postagens impugnadas, sendo insuficiente a prova produzida para demonstrar que as expressões utilizadas se referiam inequivocamente ao autor;
(3) Inexistência de conduta ofensiva ou imputação de fato criminoso específico nas postagens, não se configurando calúnia, difamação ou injúria;
(4) Inexistência de nexo causal entre as postagens e eventual abalo moral, não restando demonstrado o dano alegado;
(5) Inexistência de responsabilidade civil do réu, diante da ausência dos requisitos legais para a configuração do dever de indenizar.
IV. DISPOSITIVO:
Recurso do autor desprovido. Majoração dos honorários advocatícios para 12% sobre o valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, §§ 2º e 11, do CPC.
Dispositivos citados: CF/1988, art. 1º, III e art. 5º, IV; CC, arts. 186, 927 e 953; CPC, arts. 85, §§ 2º e 11, e 373, I; CP, arts. 138, 139 e 140.
Jurisprudência citada:
TJSC, AI n. 4032201-07.2018.8.24.0000, Rel. Desª. Cláudia Lambert de Faria
TJSC, AC n. 5004701-57.2020.8.24.0006, Rel. Des. Luiz Cézar Medeiros
TJSC, AC n. 2003.011339-8, Rel. Des. Henry Petry Junior
TJSC, Apelação Cível n. 0312484-37.2015.8.24.0023, Rel. Des. Robson Luz Varella, j. 23.06.2020
TJSC, Apelação n. 5000726-62.2019.8.24.0135, Rel. Des. Luis Francisco Delpizzo Miranda, j. 10.07.2025
TJSC, Apelação Cível n. 0000001-13.2014.8.24.0046, Rel. Des. Newton Trisotto
TJSC, Apelação Cível n. 0303285-05.2017.8.24.0125, Rel. Des. Rubens Schulz, j. 06.08.2020
STF, ADPF 779
STF, ADO 26
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Câmara de Direito Civil do decidiu, por unanimidade, conhecer do recurso, negar-lhe provimento e majorar os honorários advocatícios para 12% do valor atualizado da causa, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 11 de novembro de 2025.
assinado por LUIZ CÉZAR MEDEIROS, Desembargador, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7044167v7 e do código CRC 2d3ad2e8.
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Signatário (a): LUIZ CÉZAR MEDEIROS
Data e Hora: 12/11/2025, às 20:27:03
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Extrato de Ata EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL - RESOLUÇÃO CNJ 591/24 DE 11/11/2025 A 11/11/2025
Apelação Nº 5004006-96.2023.8.24.0039/SC
RELATOR: Desembargador LUIZ CÉZAR MEDEIROS
PRESIDENTE: Desembargador LUIZ CÉZAR MEDEIROS
PROCURADOR(A): VANIA AUGUSTA CELLA PIAZZA
Certifico que este processo foi incluído como item 30 na Pauta da Sessão Virtual - Resolução CNJ 591/24, disponibilizada no DJEN de 27/10/2025, e julgado na sessão iniciada em 11/11/2025 às 00:00 e encerrada em 11/11/2025 às 13:17.
Certifico que a 5ª Câmara de Direito Civil, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 5ª CÂMARA DE DIREITO CIVIL DECIDIU, POR UNANIMIDADE, CONHECER DO RECURSO, NEGAR-LHE PROVIMENTO E MAJORAR OS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS PARA 12% DO VALOR ATUALIZADO DA CAUSA.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador LUIZ CÉZAR MEDEIROS
Votante: Desembargador LUIZ CÉZAR MEDEIROS
Votante: Desembargadora CLÁUDIA LAMBERT DE FARIA
Votante: Desembargadora GLADYS AFONSO
ROMILDA ROCHA MANSUR
Secretária
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