Decisão TJSC

Processo: 5006069-49.2023.8.24.0054

Recurso: recurso

Relator: Desembargador ARIOVALDO ROGÉRIO RIBEIRO DA SILVA

Órgão julgador:

Data do julgamento: 19 de dezembro de 2006

Ementa

RECURSO – Documento:6788809 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA Apelação Criminal Nº 5006069-49.2023.8.24.0054/SC RELATOR: Desembargador ARIOVALDO ROGÉRIO RIBEIRO DA SILVA RELATÓRIO Na comarca de Rio do Sul, o Ministério Público ofereceu denúncia contra I. D. S., dando-o como incurso nas sanções do artigo 2º, II, da Lei nº 8.137/90, por 12 (doze) vezes, na forma do artigo 71, caput, do Código Penal, pela prática dos seguintes fatos delituosos: O denunciado I. D. S., na condição de titular e administrador da pessoa jurídica VENTOLOG TRANSPORTES EIRELI (CNPJ n. 10.882.366/0001-95, Inscrição Estadual n. 255869886, estabelecida à época dos fatos na RODOVIA BR-470, n. 5350, GALPAO 30, Bairro VALADA ITOUPAVA, Rio do Sul/SC, CEP 89162-870), deixou de efetuar, no prazo legal, o recolhimento do valor de R$ 87.373,00 (R$ 82.803,04 + R$ 4.569,96), a título de Imposto sobre Circulação de Mercadorias ...

(TJSC; Processo nº 5006069-49.2023.8.24.0054; Recurso: recurso; Relator: Desembargador ARIOVALDO ROGÉRIO RIBEIRO DA SILVA; Órgão julgador: ; Data do Julgamento: 19 de dezembro de 2006)

Texto completo da decisão

Documento:6788809 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA Apelação Criminal Nº 5006069-49.2023.8.24.0054/SC RELATOR: Desembargador ARIOVALDO ROGÉRIO RIBEIRO DA SILVA RELATÓRIO Na comarca de Rio do Sul, o Ministério Público ofereceu denúncia contra I. D. S., dando-o como incurso nas sanções do artigo 2º, II, da Lei nº 8.137/90, por 12 (doze) vezes, na forma do artigo 71, caput, do Código Penal, pela prática dos seguintes fatos delituosos: O denunciado I. D. S., na condição de titular e administrador da pessoa jurídica VENTOLOG TRANSPORTES EIRELI (CNPJ n. 10.882.366/0001-95, Inscrição Estadual n. 255869886, estabelecida à época dos fatos na RODOVIA BR-470, n. 5350, GALPAO 30, Bairro VALADA ITOUPAVA, Rio do Sul/SC, CEP 89162-870), deixou de efetuar, no prazo legal, o recolhimento do valor de R$ 87.373,00 (R$ 82.803,04 + R$ 4.569,96), a título de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e relacionado nas Dívidas Ativas de números 200001452080 e 200001785055 (valor original do tributo, sem se considerar juros e multa), que fora efetivamente cobrado/pago de consumidores/adquirentes dos produtos/serviços que a empresa em questão comercializava, de modo que, assim, mediante dolo de apropriação, locupletou-se ilicitamente da quantia recém destacada em prejuízo do Estado de Santa Catarina, conforme declarado pelo próprio sujeito passivo da obrigação em arquivos/documentos encaminhados ao Órgão Fiscal – por meio de Declarações de ICMS e do Movimento Econômico – DIME's (DVA's ns. 200001452080 e 200001785055) (vide documentação que consta anexa a esta denúncia). As apropriações indevidas de imposto realizadas pelo denunciado são ilustradas nas tabelas abaixo, tomando por parâmetro os períodos de apuração e as datas limites para repasse ao Fisco: [...] Entre 01/2019 e 12/2019 (considerados os períodos acima elencados), quando ostentava a condição de titular e administrador da pessoa jurídica em voga, I. D. S. deliberava, entre outras questões, sobre o pagamento, supressão e/ou redução dos tributos devidos ao Estado de Santa Catarina, de modo que a apropriação levada a efeito beneficiava tanto o próprio denunciado como também a já nomeada empresa. Assim, em cada período elencado acima (vide tabelas), I. D. S. determinou que a pessoa jurídica deixasse de efetuar, total ou parcialmente, o recolhimento do ICMS relativo às operações/prestações tributáveis, declarado pelo próprio sujeito passivo da obrigação e repassados ao Órgão Fiscal nos arquivos/documentação supracitados. Os valores do imposto reconhecidos como devidos, quando dos respectivos vencimentos, não foram recolhidos e, desse modo, as importâncias declaradas não ingressaram aos cofres do Erário Estadual. Ao não recolher tais valores incidentes sobre operações/prestações tributáveis e devidos ao Estado de Santa Catarina, dentro do prazo legal, o denunciado causou o prejuízo ora denunciado aos cofres públicos e, como consequência, à coletividade. Anota-se que todos os períodos supramencionados foram incluídos em regimes de parcelamentos, que, contudo, foram cancelados posteriormente, quais sejam: - Parcelamento 211100166561, incluiu todos os períodos de apuração da DVA 200001785055. No entanto, não gerou a suspensão do prazo prescricional durante sua vigência, pois fora cancelado por falta de pagamento da primeira parcela – Data de inclusão do parcelamento: 2/7/2021. Cancelamento: 15/7/2021; e - Parcelamento 211100269808, incluiu todos os períodos de apuração das DVA's 200001452080 e 200001785055, e gerou a suspensão do prazo prescricional durante sua vigência, ou seja, entre 31/8/2021 (data da inclusão) e 6/4/2023 (data do cancelamento). Registra-se que o valor integral atualizado dos débitos provenientes das Dívidas Ativas números 200001452080 e 200001785055, incluídos os juros e a multa, totaliza R$ 87.971,83 (R$ 84.930,42 + R$ 3.041,41, respectivamente). Nos casos em tela, a Secretaria de Estado da Fazenda, com base nos dados extraídos do Sistema de Administração Tributária – SAT, mediante as informações prestadas, voluntariamente e espontaneamente, pelo próprio contribuinte, constata eletronicamente a ocorrência da sonegação e, automaticamente, inscreve em dívida ativa os tributos sonegados e seus acréscimos legais, nos termos do artigo 62, §1º, da Lei n. 5.983/81. [...] Após a regular instrução do processo, sobreveio sentença que julgou improcedente a denúncia, conforme o seguinte dispositivo: Ante o exposto, com fundamento no artigo 386, incisos VI e VII, do Código de Processo Penal, julgo improcedente a denúncia formulada pelo Ministério Público de Santa Catarina para absolver I. D. S. das imputações que lhes foram feitas. Inconformado com a sentença absolutória, o Ministério Público interpôs recurso de apelação, pleiteando sua reforma para que o Apelado seja condenado como incurso nas sanções do artigo 2º, inciso II, da Lei nº 8.137/90, por doze vezes, em concurso material, nos termos do artigo 71 do Código Penal,  além da   fixação de valor mínimo para reparação dos danos sofridos pelo Estado de Catarina, com fundamento no artigo 387, inciso IV, do Código de Processo Penal (evento 102, PROMOÇÃO1). Foram ofertadas contrarrazões pelo desprovimento do recurso  (evento 109, CONTRAZ1). A Procuradoria de Justiça Criminal manifestou-se pelo conhecimento e provimento do recurso (evento 8, PARECER1). Este é o relatório que passo ao Excelentíssimo Senhor Desembargador Revisor. assinado por ARIOVALDO ROGÉRIO RIBEIRO DA SILVA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 6788809v3 e do código CRC ad47e486. Informações adicionais da assinatura: Signatário (a): ARIOVALDO ROGÉRIO RIBEIRO DA SILVA Data e Hora: 14/11/2025, às 16:43:47     5006069-49.2023.8.24.0054 6788809 .V3 Conferência de autenticidade emitida em 18/11/2025 02:06:56. Identificações de pessoas físicas foram ocultadas Documento:6788810 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA Apelação Criminal Nº 5006069-49.2023.8.24.0054/SC RELATOR: Desembargador ARIOVALDO ROGÉRIO RIBEIRO DA SILVA VOTO Trata-se de recurso de apelação criminal interposto pela representante do MINISTÉRIO PÚBLICO, inconformada com a sentença proferida pelo Juízo da Vara Criminal da Comarca de Rio do Sul, que julgou improcedente a denúncia, absolvendo I. D. S. da imputação da prática dos crimes dispostos no artigo 2°, inciso II, da Lei n. 8.137/90, por 12 (doze) vezes, na forma do artigo 71, caput, do Código Penal. Admissibilidade recursal Presentes os pressupostos de admissibilidade, o recurso deve ser conhecido. Mérito Cumpre salientar que o juízo de primeiro grau julgou improcedente a denúncia ofertada pelo Ministério Público, sob o fundamento de que “subsiste dúvida razoável quanto à presença do dolo, elemento subjetivo essencial à configuração do delito imputado”. Segundo consignado na sentença, a mera inadimplência fiscal, embora reprovável sob o prisma administrativo e tributário, não é suficiente, por si só, para ensejar a responsabilização penal, especialmente quando inserida em um contexto de comprovada crise financeira, devidamente demonstrada nos autos, e ausentes quaisquer indícios de fraude, má-fé ou intenção deliberada de suprimir tributos. Nessa linha, o magistrado sentenciante destacou que, embora não houvesse controvérsia quanto à obrigação legal do apelado em promover o recolhimento dos tributos, na condição de proprietário e administrador da empresa, restou evidenciado que, diante da grave dificuldade financeira enfrentada, era inexigível conduta diversa. Assim, reconheceu a presença da excludente de culpabilidade pela inexigibilidade de outra conduta, absolvendo o réu. Irresignado com o desfecho, o Ministério Público interpôs recurso de apelação, pugnando pela reforma da sentença e pela condenação do apelado nos exatos termos delineados na denúncia. O artigo 2º, inciso II, da Lei nº 8.137/1990, dispõe: Art. 2º Constitui crime da mesma natureza: II - deixar de recolher, no prazo legal, valor de tributo ou de contribuição social, descontado ou cobrado, na qualidade de sujeito passivo de obrigação e que deveria recolher aos cofres públicos; Pena: detenção de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa. A materialidade do delito encontra-se devidamente comprovada por meio das Declarações de Informações do ICMS e Movimento Econômico (DIME), das Certidões de Dívida Ativa e dos registros de parcelamentos posteriormente cancelados. Quanto à autoria, esta restou evidenciada pela 1ª Alteração do Ato Constitutivo da empresa VENTOLOG TRANSPORTES EIRELI, que demonstra que o apelado figurava como seu titular à época dos fatos, exercendo, portanto, poderes de direção e gerência, além de assumir responsabilidade legal e fática pela regularidade fiscal da pessoa jurídica. Sabe-se que o ICMS trata-se de imposto indireto, cujo pagamento é realizado pelo adquirente final da mercadoria ou do serviço, de modo que o comerciante atua como mero intermediário para o repasse do tributo ao fisco (Nesse sentido: TJSC, Apelação Criminal n. 0905794-24.2017.8.24.0038, de Joinville, rel. Des. Carlos Alberto Civinski, j. 12-7-2018). Quanto ao elemento subjetivo do tipo, entende-se que o delito em questão exige apenas o dolo genérico, que restou perfeitamente evidenciado nos autos, pois a ré era a responsável pelos negócios e, deliberadamente, deixou de honrar com o pagamento dos tributos devidos ao Fisco. A propósito: APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. FALTA DE RECOLHIMENTO DE ICMS EM CONTINUIDADE DELITIVA (LEI 8.137/90, ART. 2º, II, C/C O ART. 71, CAPUT, CP). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DO ACUSADO [...] CONDIÇÃO CONTRATUAL DE SÓCIO ADMINISTRADOR EXCLUSIVO QUE PERMITE A INCLUSÃO NO POLO PASSIVO. MATERIALIDADE COMPROVADA. NOTIFICAÇÕES FISCAIS NÃO CONTESTADAS. AUTORIA DEMONSTRADA. ACUSADO QUE FIGURAVA CONTRATUALMENTE COMO ADMINISTRADOR ÚNICO DA PESSOA JURÍDICA NO TEMPO DOS FATOS. RESPONSABILIDADE PELO CORRETO PAGAMENTO DOS TRIBUTOS. DOLO GENÉRICO COMPROVADO. FALTA DO RECOLHIMENTO DO IMPOSTO QUE APERFEIÇOA O TIPO PENAL. AGENTE QUE DELIBERADAMENTE DEIXA DE REPASSAR O TRIBUTO. DOLO ESPECÍFICO NÃO EXIGIDO PELO TIPO PENAL [...] (TJSC, Apelação Criminal n. 0900345-96.2014.8.24.0036, de Jaraguá do Sul, rel. Des. Sérgio Rizelo, j. 24-7-2018 - grifei).   Insta consignar, no entanto, que quando do julgamento da RHC 163.334/SC, decidiu o Supremo Tribunal Federal, que a conduta criminosa sob julgamento passou a exigir, também, a demonstração do dolo de apropriação por parte do agente. Conforme entendimento consolidado na jurisprudência do , a exigência de responsabilização penal encontra respaldo na prática reiterada do delito, evidenciada no presente caso por doze ocorrências distintas no ano de 2019 de omissão no repasse do ICMS devido ao Erário. Tal conduta resultou em prejuízo expressivo ao fisco estadual, com a sonegação de R$ 87.971,83 (oitenta e sete mil, novecentos e setenta e um reais e oitenta e três centavos), configurando, assim, a habitualidade delitiva apta a afastar a aplicação do princípio da insignificância e a justificar a persecução penal. Sobre o assunto:   PENAL. PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. APROPRIAÇÃO INDÉBITA TRIBUTÁRIA PRATICADA EM CONTINUIDADE DELITIVA (LEI 8.137/1990, ART. 2º, II, C/C ART. 71, CAPUT, DO CP). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DA DEFESA. [...] 2. MÉRITO. MATERIALIDADE E AUTORIA INCONTROVERSAS. NÃO RECOLHIMENTO DE ICMS PREVIAMENTE DECLARADO. DOLO GENÉRICO EVIDENCIADO. CONSUMAÇÃO QUE SE DÁ COM A AUSÊNCIA DO MERO REPASSE DO IMPOSTO EMBUTIDO NO PREÇO DA MERCADORIA PAGO PELO ADQUIRENTE. CRIME DE NATUREZA FORMAL QUE PRESCINDE DE RESULTADO. PLENA SUBSUNÇÃO DO FATO AO TIPO DESCRITO NO ART. 2º, II, DA LEI 8.137/1990. ENTENDIMENTO CONSOLIDADO NO STJ. CONTUMÁCIA DELITIVA E DOLO DE APROPRIAÇÃO IGUALMENTE CONFIGURADOS. REITERAÇÃO DELITIVA E APROPRIAÇÃO INDÉBITA SUPERIOR AO CAPITAL SOCIAL INTEGRALIZADO. 3. ALEGAÇÃO DE DIFICULDADES FINANCEIRAS COMO EXCLUDENTE DE CULPABILIDADE AMPARADA NA INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA. HIPÓTESE SUPRALEGAL NÃO CONFIGURADA, NEM MESMO ESTADO DE NECESSIDADE. AUSÊNCIA DE PROVA CABAL. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO". (TJSC, Apelação Criminal n. 5005641-51.2021.8.24.0082, do , rel. Carlos Alberto Civinski, Primeira Câmara Criminal, j. 11-05-2023). Portanto, devidamente configurado na hipótese o dolo de apropriação e a contumácia da inadimplência, patente a configuração do crime previsto no art. 2º, inciso II, da Lei n. 8.137/90. Outrossim, diferentemente do que pontuou o Juízo, não se pode impor a culpa dos fatos à pandemia do Covid-19 ou outros fatos de terceiros, até porque os débitos com o Fisco se iniciaram no ano de 2017 e perduraram até o ano de 2019, demonstrando o dolo de sonegar do apelado, sendo que eventuais dificuldades financeiras da pessoa jurídica não têm o condão de livrar o apelado da responsabilização penal, visto que o ICMS, conforme mencionado acima, é imposto  indireto, pago pelo consumidor final, razão pela qual cabia ao apelado efetuar apenas o repasse dos valores já cobrados do adquirente do produto/serviço. Ademais, o fato de ter sido requerido o parcelamento do débito tributário no âmbito de execução fiscal (Autos n. 5006836-92.2020.8.24.0054) não possui o condão de afastar a responsabilidade penal do agente, conforme expressamente previsto na legislação tributária vigente. O artigo 83 da Lei nº 9.430/1996 estabelece que a pretensão punitiva do Estado somente será suspensa quando o pedido de parcelamento for formalizado antes do recebimento da denúncia criminal, o que não se verifica no presente caso. O §2º do referido artigo dispõe que: “É suspensa a pretensão punitiva do Estado referente aos crimes previstos no caput, durante o período em que a pessoa física ou a pessoa jurídica relacionada com o agente dos aludidos crimes estiver incluída no parcelamento, desde que o pedido de parcelamento tenha sido formalizado antes do recebimento da denúncia criminal.” Além disso, o §4º do mesmo dispositivo legal é claro ao afirmar que: “Extingue-se a punibilidade dos crimes referidos no caput quando a pessoa física ou a pessoa jurídica relacionada com o agente efetuar o pagamento integral dos débitos oriundos de tributos, inclusive acessórios, que tiverem sido objeto de concessão de parcelamento.”  Portanto, o simples requerimento de parcelamento após o recebimento da denúncia, como ocorreu no presente caso  em que a denúncia foi recebida em 2023, e o pedido de parcelamento foi realizado no ano seguinte  não suspende a ação penal nem extingue a punibilidade. A interpretação contrária implicaria em flagrante desvirtuamento da norma legal, permitindo que contribuintes utilizem o parcelamento como instrumento de blindagem penal, sem efetivo cumprimento da obrigação tributária, o que comprometeria a efetividade da persecução penal e a proteção ao erário. O Ministério Público, em suas razões recursais, requer também a fixação de valor a ser pago pelo réu a título de reparação dos danos causados pela infração penal, correspondente ao montante global sonegado. Tal pleito encontra respaldo legal no artigo 387, inciso IV, do Código de Processo Penal, que dispõe: Art. 387.  O juiz, ao proferir sentença condenatória: [...] IV - fixará valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração, considerando os prejuízos sofridos pelo ofendido;   Da mesma forma, prevê o art. 91, inc. I, do Código Penal:   Art. 91 - São efeitos da condenação: I - tornar certa a obrigação de indenizar o dano causado pelo crime; [...]   Assim, considerando que houve nos presentes autos não só o pedido expresso de reparação por parte da acusação, mas também a comprovação efetiva do dano por meio da demonstração e apuração dos débitos inadimplidos, materializados, os quais foram devidamente apresentados ao réu, possibilitando a estes, portanto, o devido contraditório e ampla defesa, não se vislumbra qualquer irregularidade ou impossibilidade no procedimento capaz de impedir a aplicação do preceito legal reparatório. Nesse sentir, impõe-se o valor mínimo de reparação no montante de R$ 87.971,83 (oitenta e sete mil novecentos e setenta e um reais e oitenta e três centavos), descontados eventuais valores prescritos ou pagos na via administrativa ou judicial, acrescidos de juros e correção monetária contados das datas de seus respectivos vencimentos e/ou da última atualização realizada. A propósito: "O fato de a Fazenda Pública dispor de meios para a cobrança do valor sonegado (regulados pela Lei 6.830/80) não é motivo suficiente para a não fixação de valor para reparação do dano em ação penal, nos termos dos arts. 91 do Código Penal e 63 e 387, IV, do Código de Processo Penal, sobretudo porque no processo-crime obriga-se o autor do crime, enquanto na execução fiscal, em princípio, a pessoa jurídica, inexistindo, outrossim, autorização legal para tratamento discriminatório." (Apelação Criminal n. 0900077-22.2016.8.24.0020, de Criciúma, rel. Des. Sérgio Rizelo, j. em 12-9-2018). Nesse sentido: "APELAÇÃO CRIMINAL. CRIMES CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. NÃO RECOLHIMENTO DE ICMS (ART. 2º, II, DA LEI N. 8.137/90, NA FORMA DO ART. 71, CAPUT, DO CÓDIGO PENAL). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DA DEFESA. (...) PRETENSO AFASTAMENTO DO VALOR FIXADO A TÍTULO DE INDENIZAÇÃO. DESPROVIMENTO. REQUERIMENTO NA DENÚNCIA DE FIXAÇÃO DE VERBA MÍNIMA A TÍTULO DE REPARAÇÃO DO DANO CAUSADO. CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA PRESERVADOS. DEVER DE INDENIZAR QUE DECORRE DO COMETIMENTO DO FATO CRIMINOSO. MONTANTE FIXADO DE FORMA ADEQUADA, SENDO NECESSÁRIO ACRESCENTAR, DE OFÍCIO, A DESCONSIDERAÇÃO DA MULTA NO CÁLCULO, VEZ QUE SE TRATA DE PENALIDADE ADMINISTRATIVA. RECURSO CONHECIDO PARCIALMENTE E, NESTA EXTENSÃO, DESPROVIDO". (Apelação Criminal n. 5000749-55.2020.8.24.0011, de Brusque, rel. Des. Leopoldo Augusto Brüggemann, j. em 19-3-2024). Da aplicação da pena Verifica-se que a culpabilidade do réu se apresenta como compatível com a gravidade própria dos delitos de natureza tributária, não havendo elementos que a agravem de forma significativa. O réu não possui antecedentes criminais que possam macular sua conduta pretérita, o que demonstra que não se trata de agente contumaz na prática de infrações penais. A conduta social do acusado pode ser considerada mediana, não havendo registros que a desabonem de forma relevante. No que tange à personalidade do réu, não se identificam traços que revelem maior periculosidade ou propensão à prática delitiva, sendo o comportamento desviante restrito ao fato em análise. Os motivos do crime revelam-se comuns à espécie, relacionados à obtenção de vantagem indevida mediante a supressão de tributos, prática infelizmente recorrente em delitos contra a ordem tributária. As circunstâncias do fato não extrapolam aquelas ordinariamente verificadas em infrações dessa natureza, não havendo elementos que agravem a conduta. As consequências do crime, embora representem prejuízo ao erário, não se mostram de gravidade excepcional. Por fim, não há qualquer contribuição da vítima para a ocorrência do delito. Diante da análise dos vetores previstos no artigo 59 do Código Penal, a pena-base é fixada em 6 (seis) meses de detenção, cumulada com 10 (dez) dias-multa, em patamar mínimo legal, por se tratar de infração de menor potencial ofensivo, ainda que reiterada. Na segunda etapa da dosimetria, não se identificam circunstâncias agravantes que justifiquem a elevação da pena. Por outro lado, verifica-se a presença da circunstância atenuante da confissão espontânea, a qual, em regra, deveria conduzir à redução da pena. Contudo, deixa-se de aplicá-la, uma vez que a pena já se encontra fixada no mínimo legal permitido, conforme entendimento consolidado na jurisprudência, especialmente na Súmula nº 231 do Superior TRIBUNAL DE JUSTIÇA Apelação Criminal Nº 5006069-49.2023.8.24.0054/SC RELATOR: Desembargador ARIOVALDO ROGÉRIO RIBEIRO DA SILVA EMENTA   EMENTA. APELAÇÃO CRIMINAL. crime tributário.  deixar de recolher, no prazo legal, valor de tributo ou de contribuição social, descontado ou cobrado, na qualidade de sujeito passivo de obrigação e que deveria recolher aos cofres públicos (art. 2, inciso II, da lei 8.137/90).  sentença de absolvição.  RECURSO do ministério público. I. CASO EM EXAME 1. Apelação criminal interposta pelo réu contra sentença que julgou improcedente o pedido formulado na denúncia e, com fundamento no artigo 386, incisos VI e VII, do Código de Processo Penal, absolveu o réu da imputação pela prática do crime previsto no artigo 2º, II, da Lei nº 8.137/90, por 12 (doze) vezes, na forma do artigo 71, caput, do Código Penal. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. As questões submetidas a julgamento consistem em: (i) verificar se o acervo probatório é suficiente para sustentar a condenação (ii) fixação de valor a ser pago pelo réu a título de reparação dos danos causados pela infração penal, correspondente ao montante global sonegado. III. RAZÕES DE DECIDIR 3.  A materialidade do delito encontra-se devidamente comprovada por meio das Declarações de Informações do ICMS e Movimento Econômico (DIME), das Certidões de Dívida Ativa e dos registros de parcelamentos posteriormente cancelados. Quanto à autoria, esta restou evidenciada pela 1ª Alteração do Ato Constitutivo da empresa, que demonstra que o apelado figurava como seu titular à época dos fatos, exercendo, portanto, poderes de direção e gerência, além de assumir responsabilidade legal e fática pela regularidade fiscal da pessoa jurídica. 4.Sabe-se que o ICMS trata-se de imposto indireto, cujo pagamento é realizado pelo adquirente final da mercadoria ou do serviço, de modo que o comerciante atua como mero intermediário para o repasse do tributo ao fisco (Nesse sentido: TJSC, Apelação Criminal n. 0905794-24.2017.8.24.0038, de Joinville, rel. Des. Carlos Alberto Civinski, j. 12-7-2018). Portanto, devidamente configurado na hipótese o dolo de apropriação e a contumácia da inadimplência, patente a configuração do crime previsto no art. 2º, inciso II, da Lei n. 8.137/90. 5.Outrossim, diferentemente do que pontuou o Juízo, não se pode impor a culpa dos fatos à pandemia do Covid-19 ou outros fatos de terceiros, até porque os débitos com o Fisco se iniciaram no ano de 2017 e perduraram até o ano de 2019, demonstrando o dolo de sonegar do apelado, sendo que eventuais dificuldades financeiras da pessoa jurídica não têm o condão de livrar o apelado da responsabilização penal, visto que o ICMS, conforme mencionado acima, é imposto  indireto, pago pelo consumidor final, razão pela qual cabia ao apelado efetuar apenas o repasse dos valores já cobrados do adquirente do produto/serviço. 6. Ademais, o fato de ter sido requerido o parcelamento do débito tributário no âmbito de execução fiscal, não possui o condão de afastar a responsabilidade penal do agente, conforme expressamente previsto na legislação tributária vigente. O artigo 83 da Lei nº 9.430/1996 estabelece que a pretensão punitiva do Estado somente será suspensa quando o pedido de parcelamento for formalizado antes do recebimento da denúncia criminal, o que não se verifica no presente caso. 7. Fixação de valor a ser pago pelo réu a título de reparação dos danos causados pela infração penal, nos termos do artigo 387, inciso IV, do Código de Processo Penal. IV. DISPOSITIVO 8. Recurso conhecido e provido.   ACÓRDÃO ACÓRDÃO Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 1ª Câmara Criminal do decidiu, por unanimidade, conhecer do recurso e dar-lhe provimento para condenar o apelado I. D. S. à pena de 10 (dez) meses de detenção, a ser cumprida em regime inicial aberto, e à sanção de 17 (dezessete) dias-multa, pela prática do crime previsto no artigo 2º, inciso II, da Lei nº 8.137/90, cometido por 12 (doze) vezes, nos termos do artigo 71, caput, do Código Penal, reconhecendo-se a continuidade delitiva. Nos termos do voto, substituo a pena privativa de liberdade por pena restritiva de direitos, consistente na prestação pecuniária, conforme os parâmetros fixados, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. Florianópolis, 11 de novembro de 2025. assinado por ARIOVALDO ROGÉRIO RIBEIRO DA SILVA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 6788808v4 e do código CRC aa582110. Informações adicionais da assinatura: Signatário (a): ARIOVALDO ROGÉRIO RIBEIRO DA SILVA Data e Hora: 14/11/2025, às 16:43:47     5006069-49.2023.8.24.0054 6788808 .V4 Conferência de autenticidade emitida em 18/11/2025 02:06:56. Identificações de pessoas físicas foram ocultadas Extrato de Ata EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL - RESOLUÇÃO CNJ 591/24 DE 06/11/2025 A 12/11/2025 Apelação Criminal Nº 5006069-49.2023.8.24.0054/SC RELATOR: Desembargador ARIOVALDO ROGÉRIO RIBEIRO DA SILVA REVISORA: Desembargadora ANA LIA MOURA LISBOA CARNEIRO PRESIDENTE: Desembargador ARIOVALDO ROGÉRIO RIBEIRO DA SILVA PROCURADOR(A): PEDRO SERGIO STEIL Certifico que este processo foi incluído como item 133 na Pauta da Sessão Virtual - Resolução CNJ 591/24, disponibilizada no DJEN de 21/10/2025, e julgado na sessão iniciada em 06/11/2025 às 00:00 e encerrada em 11/11/2025 às 19:00. Certifico que a 1ª Câmara Criminal, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão: A 1ª CÂMARA CRIMINAL DECIDIU, POR UNANIMIDADE, CONHECER DO RECURSO E DAR-LHE PROVIMENTO PARA CONDENAR O APELADO I. D. S. À PENA DE 10 (DEZ) MESES DE DETENÇÃO, A SER CUMPRIDA EM REGIME INICIAL ABERTO, E À SANÇÃO DE 17 (DEZESSETE) DIAS-MULTA, PELA PRÁTICA DO CRIME PREVISTO NO ARTIGO 2º, INCISO II, DA LEI Nº 8.137/90, COMETIDO POR 12 (DOZE) VEZES, NOS TERMOS DO ARTIGO 71, CAPUT, DO CÓDIGO PENAL, RECONHECENDO-SE A CONTINUIDADE DELITIVA. NOS TERMOS DO VOTO, SUBSTITUO A PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR PENA RESTRITIVA DE DIREITOS, CONSISTENTE NA PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA, CONFORME OS PARÂMETROS FIXADOS. RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador ARIOVALDO ROGÉRIO RIBEIRO DA SILVA Votante: Desembargador ARIOVALDO ROGÉRIO RIBEIRO DA SILVA Votante: Desembargadora ANA LIA MOURA LISBOA CARNEIRO Votante: Desembargador PAULO ROBERTO SARTORATO ALEXANDRE AUGUSTO DE OLIVEIRA HANSEL Secretário Conferência de autenticidade emitida em 18/11/2025 02:06:56. Identificações de pessoas físicas foram ocultadas