RECURSO – Documento:6886098 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA Apelação Nº 5006487-16.2024.8.24.0033/SC RELATOR: Desembargador Substituto MARCELO PONS MEIRELLES RELATÓRIO Trata-se de Apelação Cível interposta por CMA CGM DO BRASIL AGÊNCIA MARÍTIMA LTDA. com o desiderato de reformar a sentença que julgou procedentes os pedidos formulados nos autos da Ação de indenização por danos materiais. Em atenção ao princípio da economia e, sobretudo, por refletir o contexto estabelecido durante o trâmite processual, reitero o relatório apresentado na decisão objeto do recurso, in verbis (evento 36, SENT1):
(TJSC; Processo nº 5006487-16.2024.8.24.0033; Recurso: recurso; Relator: Desembargador Substituto MARCELO PONS MEIRELLES; Órgão julgador: ; Data do Julgamento: 19 de dezembro de 2006)
Texto completo da decisão
Documento:6886098 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Apelação Nº 5006487-16.2024.8.24.0033/SC
RELATOR: Desembargador Substituto MARCELO PONS MEIRELLES
RELATÓRIO
Trata-se de Apelação Cível interposta por CMA CGM DO BRASIL AGÊNCIA MARÍTIMA LTDA. com o desiderato de reformar a sentença que julgou procedentes os pedidos formulados nos autos da Ação de indenização por danos materiais.
Em atenção ao princípio da economia e, sobretudo, por refletir o contexto estabelecido durante o trâmite processual, reitero o relatório apresentado na decisão objeto do recurso, in verbis (evento 36, SENT1):
[...] Cuido de ação de indenização por danos materiais ajuizada por POMMER COMERCIO INTERNACIONAL LTDA em desfavor de CMA CGM DO BRASIL AGÊNCIA MARÍTIMA LTDA.
Defendeu a autora que contratou a ré para realizar transporte de carga de gengibres do Rio de Janeiro até os EUA, mas a carga chegou estragada nos EUA, sem possibilidade de utilização, por causa de omissão da ré no transporte. Assim, ajuizou a presente demanda para reparação do dano material que sofreu com a carga perdida e com o preço do transporte (total: USD 51.587,19).
Após a decisão inicial de ev. 8, a ré foi citada (ev. 12) e apresentou contestação (ev. 13), na qual levantou preliminares, defendeu que a carga poderia estar danificada desde o momento da entrega pela autora, sustentou que o valor postulado não é devido e requereu a improcedência da pretensão autoral. Juntou documentos.
Houve réplica (ev. 18).
Intimadas para especificação de provas (ev. 19), as partes não requereram novas provas (ev. 23 e 24).
Vieram os autos conclusos. É o relatório.
E da parte dispositiva:
[...] Ante o exposto, com base no art. 487, I, do CPC, JULGO PROCEDENTE o pedido inicial para CONDENAR a ré ao pagamento à autora de USD 51.587,19, que deverá ser convertido à moeda nacional, corrigido desde o prejuízo (26/08/2023 - data de entrega da carga) até o efetivo pagamento (Súmula 43 do STJ) e acrescido de juros de mora simples a contar da citação (02/04/2024 - ev. 12).
Acerca dos consectários legais, a correção monetária deve se dar, segundo o histórico de indexadores do iCGJ, observando-se a aplicação do INPC até 29.08.2024, e do IPCA a partir de 30.08.2024, nos termos do art. 389, parágrafo único, do Código Civil.
O valor deverá ser acrescido, ainda, de juros de mora, observado o índice de 1% ao mês até 29.08.2024, e, após 30.08.2024, a variação da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (SELIC), deduzido o índice de atualização monetária (art. 406, § 1º, do Código Civil).
Condeno a ré ao pagamento das custas processuais e de honorários sucumbenciais, estes que fixo em 10% sobre o valor atualizado da condenação.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Com o trânsito em julgado, arquivem-se os autos.
Ato contínuo, a ré opôs embargos de declaração (evento 40, EMBDECL1), os quais foram rejeitados (evento 57, SENT1).
Inconformada, a requerida CMA CGM SOCIETÉ ANONYME, representada pelo seu agente geral no Brasil, CMA CGM DO BRASIL AGÊNCIA MARÍTIMA LTDA., apelou. Preliminarmente, sustentou "ausência de jurisdição do A parte apelada, em contrarrazões, postulou pelo desprovimento do reclamo e manutenção da sentença na sua integralidade (evento 73, CONTRAZ1).
É o relatório.
VOTO
1. Admissibilidade
Desde logo, verifico que a apelação é tempestiva, o preparo foi devidamente recolhido (evento 64, CUSTAS2), a parte está regularmente representada, o recurso e as razões desafiam a decisão objurgada, ao passo que não incidem nenhuma das hipóteses elencadas no art. 932, inciso IV, do Código de Processo Civil.
Portanto, presentes os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, conheço do recurso.
2. Preliminares/Prejudiciais de Mérito
2.1 Incompetência da Justiça Brasileira
Aduz a recorrente, em síntese, que o foro competente para processar e julgar o feito é o Tribunal de Comércio de Marselha, em razão da cláusula de eleição do foro estrangeiro. Enfatiza ainda, que o contrato firmado com a parte autora não é de adesão, devendo, portanto, ser respeitado o foro eleito pelas partes.
Contudo, razão não assiste a recorrente.
Embora no contrato firmado entre as partes contenha previsão expressa de que: "All claims and actions arising between the Carrier and the Merchant in relation with the contract of Carriage evidenced by this Waybill shall exclusively be brought before the Tribunal de Commerce de Marseille and no other Court shall have jurisdiction with regards to any such claim or action. Notwithstanding the above, the Carrier is also entitled to bring the claim or action before the Court of the place where the defendant has his registered office" (13.10).
Traduzindo-se para o portugês, que:
[...] "Todas as reivindicações e ações decorrentes entre o Transportador e o Comerciante em relação ao contrato de Transporte evidenciado por este Conhecimento de Embarque deverão ser apresentadas exclusivamente ao Tribunal de Comércio de Marselha, e nenhum outro tribunal terá jurisdição em relação a qualquer reivindicação ou ação desse tipo. Não obstante o acima exposto, o Transportador também tem o direito de apresentar a reivindicação ou ação perante o tribunal do local onde o réu possui sua sede registrada".
Referida cláusula não tem o condão de afastar a competência da justiça brasileira, como tenta fazer crer o apelante, pois o instrumento contratual em questão caracteriza um típico contrato de adesão.
No mesmo sentido:
APELAÇÃO CÍVEL. TRANSPORTE MARÍTIMO INTERNACIONAL DE MERCADORIAS. AÇÃO DE COBRANÇA DE SOBRE-ESTADIAS (DEMURRAGE) AJUIZADA PELA TRANSPORTADORA EM DESFAVOR DA IMPORTADORA. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA PARCIAL. RECURSO DA RÉ.
ALEGADA AUSÊNCIA DE RESPONSABILIDADE PELO PAGAMENTO DA INDENIZAÇÃO PELA SOBRE-ESTADIA DOS CONTÊINERES. TESE REJEITADA. DOCUMENTOS QUE INSTRUEM A AÇÃO SUFICIENTES PARA COMPROVAR A DEVOLUÇÃO TARDIA E JUSTIFICAR A COBRANÇA DA DEMURRAGE. DESÍDIA DA RÉ NO PROCESSO DE NACIONALIZAÇÃO DA CARGA, RECONHECIDA NOS AUTOS CONEXOS, QUE CORROBORA O DEVER DE PAGAMENTO DA OBRIGAÇÃO. SENTENÇA MANTIDA.
SUSTENTADA ABUSIVIDADE DO CONTRATO DEVIDO À ONEROSIDADE EXCESSIVA. INSUBSISTÊNCIA. CONTRATO DE TRANSPORTE MARÍTIMO TIPICAMENTE DE ADESÃO [...] RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJSC, Apelação n. 0306368-14.2017.8.24.0033, do , rel. Mariano do Nascimento, Primeira Câmara de Direito Comercial, j. 24-04-2025 - grifo nosso).
APELAÇÃO CÍVEL. TRANSPORTE MARÍTIMO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. LIBERAÇÃO DA CARGA RETIDA PELO ARMADOR. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DA PARTE RÉ. 1. PRELIMINARES [...] 1.2. CLÁUSULA DE ELEIÇÃO DE FORO INTERNACIONAL. NULIDADE. CONTRATO DE ADESÃO. VULNERABILIDADE DA PARTE ADERENTE PELA SUA PEQUENA EXPRESSÃO ECONÔMICA. PACTO DE ADESÃO QUE VEDA O ACESSO À JUSTIÇA. QUEBRA DE ISONOMIA. EXEGESE DO ART. 25, § 2º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. SENTENÇA ESCORREITA.
"A cláusula de eleição de foro prevista em contrato de adesão é nula de pleno direito quando representa óbice ao acesso à justiça para o contraente. A falta de liberdade na pactuação dos contratos de transporte marítimo internacional, significa, no mais das vezes, a eleição de foro cujo aparato legislativo foi arquitetado para proteger as grandes transportadoras [...]"(TJSC, Apelação n. 5007265-88.2021.8.24.0033, do , rel. Osmar Mohr, Sexta Câmara de Direito Comercial, j. 05-09-2024 - grifo nosso).
Não bastasse, restou demonstrado que a obrigação contratual de serviço de transporte de carga foi executada no Brasil, e que a empresa CMA CGM do Brasil Agência Marítima, ora ré/apelante, possui representação no município de Itajaí/SC, motivo pelo qual a ação foi ajuizada na referida cidade.
O artigo 21 do Código de Processo Civil normatiza:
Art. 21. Compete à autoridade judiciária brasileira processar e julgar as ações em que:
I - o réu, qualquer que seja a sua nacionalidade, estiver domiciliado no Brasil;
II - no Brasil tiver de ser cumprida a obrigação;
III - o fundamento seja fato ocorrido ou ato praticado no Brasil.
Parágrafo único. Para o fim do disposto no inciso I, considera-se domiciliada no Brasil a pessoa jurídica estrangeira que nele tiver agência, filial ou sucursal.
Em complemento, o art. 53, inc. III, "a", do CPC normatiza:
Art. 53. É competente o foro:
[...] III - do lugar:
a) onde está a sede, para a ação em que for ré pessoa jurídica [...].
Tem-se ainda a previsão normativa contida no art. 63, § 1º, do CPC, a qual preceitua que: "A eleição de foro somente produz efeito quando constar de instrumento escrito, aludir expressamente a determinado negócio jurídico e guardar pertinência com o domicílio ou a residência de uma das partes ou com o local da obrigação, ressalvada a pactuação consumerista, quando favorável ao consumidor", situação que não se verifica no presente caso.
E como bem consignado pelo juízo a quo: "não faz sentido o foro competente ser o de Marselha, na França, quando a carga saiu do Brasil para os EUA e ambas as partes possuem domicílio no Brasil" (36.1).
Assim, fica evidente que não há que se falar em incompetência do 2.2 Ilegitimidade ativa
Aduz a requerida que a empresa autora não possui legitimidade ativa para propor a ação, pois "não se sub-rogou nos direitos da compradora", devendo, portanto, ser reconhecida aludida mácula.
Do mesmo modo, razão não assiste a recorrente. Isso porque, ao contrário do que alega a ré, verifica-se que a autora apresentou carta de cessão de direitos (1.6):
E do aludido documento, traduzindo-se para o português, se extrai:
CARTA DE CESSÃO DE DIREITOS
Pommer Fresh Foods INC., empresa privada, estabelecida em 3439 NW 55TH ST, Condado de Broward, Flórida, Estados Unidos, por seu responsável legal abaixo assinado, por meio deste nomeia:
Pommer Comercio Internacional Ltda., empresa privada, estabelecida na Ladeira Manoel Candeia, 160 – Santa Maria do Jetibá/Espírito Santo/Brasil. CEP n. 29.645-000, inscrita no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas (CNPJ) sob o nº 06.088.328/0001-98, para praticar todos os atos necessários, judiciais ou extrajudiciais, no Brasil ou no exterior, para proceder com todas as reivindicações contra a transportadora ou outra parte envolvida, relacionadas à operação de importação consignada à Pommer Fresh Foods INC.
Data de Expiração: período indefinido (sem prazo fixo).
E como bem consignado pelo juízo a quo (36.1):
[...] Afasto a preliminar de ilegitimidade ativa. Tanto a empresa com sede nos EUA quando a empresa com sede no Brasil possuem nome similar, de modo que atuam juntas no mercado, o que viabiliza o ajuizamento da demanda pela ora autora, sem prejuízo de eventual ação regressiva por terceira. Além disso, há documento "assignment of rights letter" (ev. 1, DOC6 e fl. 14 da contestação) com trecho expresso com autorização para a empresa brasileira buscar seus direitos em nome da empresa norte-americana.
Assim sendo, fica evidente que a parte autora possui legitimidade ativa para propor a presente demanda.
E inexistentes outras preliminares a serem aprecidas, nem mesmo de ofício, passo, então, à análise do mérito.
3. Mérito
3.1 Do pedido de reforma da sentença
Aduz a parte ré, em linhas gerais, que o nexo causal não restou comprovado. Para tanto, alega que "recebeu o contêiner estufado e lacrado", e que as instruções repassadas pela autora para o transporte estavam incorretas, pois embora tenha exigido que a "ventilação do contêiner fosse de 50m³/h, a ventilação recomendada para o transporte de gengibres frescos é de 10 m³/hora (10 Cbm/Hr), isto é, 5 (CINCO) VEZES MENOS do que o volume de ventilação solicitado pela apelada". Sustenta ainda, que foi contratada para transportar a carga do porto do Rio de Janeiro/RJ até o porto de Everglades (E.U.A.), e que a oscilação de temperatura utilizada para fundamentar a sentença não ocorreu durante o transporte, devendo, portanto, ser reformada a decisão e julgados improcedentes os pedidos contidos na inicial.
Contudo, inviável o acolhimento do pleito.
Conforme restou comprovado, a requerida foi contratada para realizar o transporte marítimo de uma carga de gengibre, e embora alegue que sua responsabilidade civil não ficou comprovada, em razão da alegada ausência de demonstração do nexo causal, referida arguição não se sustenta.
Acerca do tema, o art. 186 do Código Civil normatiza que: "Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito".
Em complemento, o art. 927 do CC preceitua: "Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo".
O contrato de transporte, conforme previsto nos artigos 730 a 756 do Código Civil Brasileiro, é caracterizado como um contrato de resultado, ou seja, o transportador assume a obrigação de entregar a carga no destino acordado, dentro do prazo e nas condições ajustadas.
Vale ainda ressaltar que a responsabilidade do transportador é objetiva, ou seja, presume-se sua culpa em caso de descumprimento, salvo prova robusta de excludente legal.
O art. 734 do Código Civil dispõe que: "O transportador responde pelos danos causados às pessoas transportadas e às suas bagagens, salvo motivo de força maior, sendo responsável pela integridade da carga desde o momento em que a recebe até sua efetiva entrega".
Adicionalmente, o artigo 749 do mesmo diploma legal estabelece que: "O transportador é obrigado a indenizar o prejuízo resultante da mora na entrega da carga, salvo motivo de força maior".
In casu, se extrai do contrato firmado entre as partes que a ré era a empresa responsável pelo transporte da carga, que o embarque seria realizado no Porto do Rio de Janeiro/RJ e que o Porto de descarga era Port Everglades, FL, nos Estados Unidos (1.4):
Na parte das informações técnicas do transporte, ficou consignado que: "A carga está armazenada em container refrigerado ajustado para a temperatura solicitada pelo remetente" (1.4):
Traduzindo-se aludidas recomendações para o portugês, tem-se as seguintes informações:
CGMU5458597
1 x 40RH (container refrigerado)
1400 Caixas
Peso líquido: 19.040,00 kg
Peso bruto: 21.000,00 kg
Volume (CBM): 50,000
BRAZILIAN BEST
091011 (HS)
NCM: 091011
GENGIBRE FRESCO
TEMPERATURA: +13°C
VENTILAÇÃO: 50 m³/h
PCI 139/2023
DU-E 23BR001208015-0
RUC 3BR060883282000000000000000001392023
POMMER FDA: 12528956018
GGN 4056186722256 GLOBAL GAP
GENGIBRE CERTIFICADO
CÓDIGO DE BARRAS: 0751320974266
CÓDIGO SERIAL DO TERMÓGRAFO: 7305859
RUC: 3BR0608832820000000000000000001392023
DU-E: 23BR001208015-0
A carga está armazenada em container refrigerado ajustado para a temperatura solicitada pelo remetente.
Como se vê, a ré tinha ciência da carga de gengibres frescos que estava transportando e que eram necessárias: "temperatura +13º e ventilação 50m³/h", para que a mercadoria chegasse ao destino final em perfeitas condições.
Extrai-se do relatório de inspeção marítima realizado pela empresa Alpha Marine Surveyours que (1.23):
[...] De acordo com as informações de rastreamento do contêiner, o contêiner em questão foi enviado vazio ao remetente em 24/07/2023 em Vitória, retornando cheio para exportação em 26/07/2023 no Rio de Janeiro, Brasil. O contêiner foi carregado a bordo do navio APL Turkey em 05/08/2023, partindo no dia seguinte, 06/08/2023. O contêiner foi descarregado para transbordo em 17/08/2023 em Cartagena, Colômbia. Em seguida, o contêiner foi carregado a bordo do CMA CGM Pregolia em 23/08/2023, descarregando em 26/08/2023 em Port Everglades, FL. O contêiner foi liberado ao consignatário em 29/08/2023.
E que a causa do perecimento da mercadoria, "se deve a possível falha na refrigeração" (1.23).
Corroborando aludida informação, tem-se o "Relatório de Chegada de Remessa", no qual é possível verificar, de forma isenta de dúvidas, que houve oscilação nas condições exigidas durante o transporte da carga (1.11):
As imagens, também comprovam que a mercadoria chegou mofada, apodrecida e sem condições de ser comercializada (1.7):
Assim, considerando que restou comprovado que a mercadoria saiu do Porto do Rio de Janeiro/RJ no dia 05/08/2023 e chegou ao destino final no dia 26/08/2023, e que pelo gráfico apresentado, ao contrário do que a ré alega, houve considerável oscilação nas condições exigidas de temperatura e ventilação durante o transporte, conforme demonstra o pico de temperatura registrado no dia 17/08/2023, fica evidente que razão não assiste a recorrente.
E ainda que a apelante alegue que as instruções repassadas pela empresa contratante eram inadequadas, e que a ventilação correta recomendada para o transporte de gengibres frescos "era 5 (cinco) vezes menor do que o volume de ventilação solicitado pela apelada", referida arguição além de não restar comprovada, não tem o condão de isentar a ré de sua responsabilidade, pois como bem consignado na sentença (36.1):
[...] Sobre a ventilação (em Cbm/h - cubic meters per hour), a ré sustentou que a autora orientou o transporte em 50 m³/h, ao passo que o correto para a carga de gengibre seria 10 m³/h. No entanto, deveria a ré ter visto isso antes do transporte, pois o transporte é de responsabilidade dela, e não da autora.
Caso a ré entendesse que, diante da orientação da autora, não poderia fazer o transporte de maneira segura e manter a carga na mesma qualidade de quando deixou o Brasil, deveria ter tomado as providências cabíveis ou recusar o serviço.
No momento que a ré aceitou e prestou o serviço, tomou para si a responsabilidade por eventuais danos, ciente ainda de que o serviço de transporte é de resultado, e não de meio. Com isso, não pode a ré, agora, tentar se eximir da sua responsabilidade e deixar a autora no prejuízo.
Portanto, havendo perecimento da carga durante o transporte marítimo, e não sendo comprovada a ocorrência de caso fortuito, força maior, vício próprio da mercadoria ou culpa exclusiva do remetente, a empresa transportadora deve ser responsabilizada civilmente pelos danos causados.
Assim, tendo em vista que, nos moldes do art. 750 do Código Civil "A responsabilidade do transportador, limitada ao valor constante do conhecimento, começa no momento em que ele, ou seus prepostos, recebem a coisa; termina quando é entregue ao destinatário, ou depositada em juízo, se aquele não for encontrado"; que a transportadora ré não comprovou de forma inequívoca que o perecimento da carga decorreu de fator externo, imprevisível e/ou inevitável, ônus este que lhe competia, nos moldes do art. 393 do CC; e que em contratos dessa natureza, o contratante/remetente, ora apelado, precisa apenas demonstrar o inadimplemento ou o dano, torna-se inviável o acolhimento do pleito.
No mesmo sentido, em caso análogo, esta Corte assim decidiu:
APELAÇÃO CÍVEL. TRANSPORTE MARÍTIMO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. PERECIMENTO DE CARGA DE ALHOS FRESCOS DEVIDO À CONTAMINAÇÃO FÚNGICA (FORMAÇÃO DE MOFO/BOLOR). SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DA PARTE RÉ.
1 - ALEGAÇÃO DE QUE A ALTA TEMPERATURA E A MÁ COLOCAÇÃO DAS MERCADORIAS NO MOMENTO DA ESTUFAGEM TERIAM CAUSADO OS VÍCIOS IDENTIFICADOS NA CARGA. INSUBSISTÊNCIA. CARGA VISTORIADA E APROVADA PELA AUTORIDADE FITOSSANITÁRIA DO EGITO, PAÍS EXPORTADOR, ANTES DO EMBARQUE. CONHECIMENTO DE EMBARQUE (BILL OF LADING) ASSINADO POR REPRESENTANTE DA TRANSPORTADORA QUE ATESTA A REGULARIDADE DO ACONDICIONAMENTO DA CARGA. CONSTATADAS AVARIAS NO CONTÊINER PELO AGENTE PORTUÁRIO DE DESTINO. DEFEITOS NO COMPARTIMENTO QUE INDICAM A PERDA DE EFICÁCIA DO SISTEMA DE REFRIGERAÇÃO E DESUMIDIFICAÇÃO. CONCLUSÃO CORROBORADA PELO RELATÓRIO DE MONITORAMENTO DA TEMPERATURA E UMIDADE DO CONTÊINER (DOWNLOAD), QUE APONTA VARIAÇÕES NESSES PARÂMETROS DURANTE O PERCURSO. LIAME CAUSAL CONFIGURADO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO TRANSPORTADOR. INTELIGÊNCIA DO ART. 750 DO CÓDIGO CIVIL. PRECEDENTES. SENTENÇA QUE MERECE SER MANTIDA. IRRESIGNAÇÃO DESPROVIDA. [...] (TJSC, Apelação n. 5000147-12.2021.8.24.0017, do , rel. Dinart Francisco Machado, Terceira Câmara de Direito Comercial, j. 29-08-2024 - grifo nosso).
Assim, não há como aderir às teses lançadas pela parte apelante, concluindo-se pela manutenção da sentença nos seus exatos termos.
4. Ônus de Sucumbência
Com a manutenção da sentença, desnecessária a readequação dos ônus de sucumbência.
5. Honorários Recursais
Para fins de arbitramento dos honorários advocatícios recursais previstos no § 11 do art. 85 do Código de Processo Civil, faz-se necessário o preenchimento cumulativo dos seguintes requisitos: a) decisão recorrida publicada a partir de 18/03/2016, quando entrou em vigor o Código de Processo Civil; b) recurso não conhecido integralmente ou desprovido, monocraticamente ou pelo órgão colegiado competente; e c) condenação em honorários advocatícios desde a origem (STJ, AgInt nos EREsp 1.539.725/DF, rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, Segunda Seção, j. 09-08-2017).
Na hipótese, cabível o arbitramento da verba. Sendo assim, considerando a natureza da demanda, a apresentação de contrarrazões, o desprovimento do reclamo e mantido o mesmo critério da origem, fixo honorários recursais em 2% (dois por cento), alcançando o patamar final de honorários advocatícios em 12% (doze por cento) sobre o valor atualizado da condenação.
6. Dispositivo
Ante o exposto, voto no sentido de conhecer do recurso, afastar as preliminares e negar-lhe provimento.
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Apelação Nº 5006487-16.2024.8.24.0033/SC
RELATOR: Desembargador Substituto MARCELO PONS MEIRELLES
EMENTA
APELAÇÃO CÍVEL. TRANSPORTE MARÍTIMO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS DECORRENTE DO PERECIMENTO DA CARGA DE GENGIBRE FRESCO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. RECURSO DA RÉ.
PRELIMINAR. PRETENDIDO RECONHECIMENTO DA COMPETÊNCIA PARA PROCESSAR E JULGAR O FEITO DO TRIBUNAL DE COMÉRCIO DE MARSELHA, EM RAZÃO DA CLÁUSULA DE ELEIÇÃO DE FORO ESTRANGEIRO. IMVIABILIDADE. CONTRATO DE TRANSPORTE MARÍTIMO TIPICAMENTE DE ADESÃO. ELEIÇÃO DO FORO QUE SOMENTE PRODUZ EFEITO QUANDO GUARDAR PERTINÊNCIA COM O DOMICÍLIO DE UMA DAS PARTES. CARGA QUE SAIU DO BRASIL E POSSUÍA DESTINO FINAL NOS ESTADOS UNIDOS. OBSERVÂNCIA AO ART. 21, INCISO I E PARÁGRAFO ÚNICO, ART. 53, INCISO III, "A", E ART. 63, § 1º, TODOS DO CPC. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA BRASILEIRA MANTIDA.
AVENTADA ILEGITIMIDADE ATIVA. INOCORRÊNCIA. EMPRESAS ATUANTES NO BRASIL E NO EXTERIOR. CARTA DE CESSÃO DE DIREITOS CONSTANTE NOS AUTOS AUTORIZANDO A EMPRESA ESTABELECIDA NO BRASIL A PRATICAR TODOS OS ATOS JUDICIAIS NECESSÁRIOS. PREJUDICIAL RECHAÇADA.
MÉRITO. REQUERIDA REFORMA DA SENTENÇA. ALEGADA AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DO NEXO CAUSAL. IMPOSSIBILIDADE. RELATÓRIO DE INSPEÇÃO MARÍTIMA E LAUDO PERICIAL QUE COMPROVAM OSCILAÇÃO DE TEMPERATURA E VENTILAÇÃO DO CONTÊINER. CAUSAS QUE FORAM DETERMINANTES PARA O PERECIMENTO DA MERCADORIA, QUE CHEGOU AO DESTINO MOFADA E APODRECIDA, SEM CONDIÇÕES DE SER COMERCIALIZADA. CONTRATO DE TRANSPORTE QUE É DE RESULTADO. OBSERVÂNCIA AOS ARTS. 730 A 756 DO CC. PREJUÍZO DA EMPRESA CONTRATANTE DEVIDAMENTE COMPROVADO. DEVER DE INDENIZAR QUE SE IMPÕE, NOS MOLDES DOS ARTS. 186 E 927 DO CC. DECISÃO ESCORREITA MANTIDA.
HONORÁRIOS RECURSAIS CABÍVEIS.
RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 2ª Câmara de Direito Comercial do decidiu, por unanimidade, conhecer do recurso, afastar as preliminares e negar-lhe provimento, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 11 de novembro de 2025.
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Extrato de Ata EXTRATO DE ATA DA SESSÃO ORDINÁRIA FÍSICA DE 11/11/2025
Apelação Nº 5006487-16.2024.8.24.0033/SC
RELATOR: Desembargador Substituto MARCELO PONS MEIRELLES
PRESIDENTE: Desembargador ROBSON LUZ VARELLA
PROCURADOR(A): NEWTON HENRIQUE TRENNEPOHL
SUSTENTAÇÃO ORAL PRESENCIAL: PEDRO LUIZ MONTENEGRO DA COSTA por CMA CGM DO BRASIL AGÊNCIA MARÍTIMA LTDA
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Ordinária Física do dia 11/11/2025, na sequência 179, disponibilizada no DJe de 24/10/2025.
Certifico que a 2ª Câmara de Direito Comercial, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 2ª CÂMARA DE DIREITO COMERCIAL DECIDIU, POR UNANIMIDADE, CONHECER DO RECURSO, AFASTAR AS PRELIMINARES E NEGAR-LHE PROVIMENTO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Substituto MARCELO PONS MEIRELLES
Votante: Desembargador Substituto MARCELO PONS MEIRELLES
Votante: Desembargador ROBSON LUZ VARELLA
Votante: Desembargador STEPHAN K. RADLOFF
BIANCA DAURA RICCIO
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 16/11/2025 16:36:30.
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