EMBARGOS – Documento:6873064 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA Apelação Nº 5008868-18.2020.8.24.0039/SC RELATOR: Desembargador EDUARDO GALLO JR. RELATÓRIO Os Espólios de M. E. B. C. e de O. F. D. C., representados pela inventariante E. A. F. B., propuseram ação de exigir contas, perante o Juízo da 2ª Vara Cível da Comarca de Lages, contra T. R. M.. Na inicial, narraram que: firmaram, em 2016, contrato de arrendamento com o requerido, tendo como objeto a área rural de 43 hectares localizada em Passos dos Fernandes, Lages/SC, arrendado para o plantio de soja; o arrendamento estava atrelado ao contrato de comodato firmado com o herdeiro Volnei Osmar Fernandes, pelo qual condicionou o usufruto à celebração do arrendamento; nos termos do contrato, seriam devidas as quantias, por safra, de 10 sacas de soja por hectare, as quais deveriam ser depositadas em nome dos autores na Cooperplan - Coope...
(TJSC; Processo nº 5008868-18.2020.8.24.0039; Recurso: embargos; Relator: Desembargador EDUARDO GALLO JR.; Órgão julgador: ; Data do Julgamento: 11 de novembro de 2025)
Texto completo da decisão
Documento:6873064 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Apelação Nº 5008868-18.2020.8.24.0039/SC
RELATOR: Desembargador EDUARDO GALLO JR.
RELATÓRIO
Os Espólios de M. E. B. C. e de O. F. D. C., representados pela inventariante E. A. F. B., propuseram ação de exigir contas, perante o Juízo da 2ª Vara Cível da Comarca de Lages, contra T. R. M..
Na inicial, narraram que: firmaram, em 2016, contrato de arrendamento com o requerido, tendo como objeto a área rural de 43 hectares localizada em Passos dos Fernandes, Lages/SC, arrendado para o plantio de soja; o arrendamento estava atrelado ao contrato de comodato firmado com o herdeiro Volnei Osmar Fernandes, pelo qual condicionou o usufruto à celebração do arrendamento; nos termos do contrato, seriam devidas as quantias, por safra, de 10 sacas de soja por hectare, as quais deveriam ser depositadas em nome dos autores na Cooperplan - Cooperativa Agropecuária Planalto Serrano; o requerido não repassou as quantias devidas em relação a 3 safras (2017/2018, 2018/2019 e 2019/2020). Ao final, requereram a concessão de tutela provisória e a procedência dos pedidos para determinar ao requerido a prestação das contas devidas (evento 1, DOC1).
No evento 15, DOC1, a parte autora emendou a inicial para alterar o pedido e a causa de pedir, passando a postular, como tutela final, a condenação do requerido à entrega das sacas de soja devidas.
Citada, a parte ré apresentou contestação. Suscitou a inépcia da inicial, a ilegitimidade passiva e a litigância de má-fé. No mérito, sustentou que: os autores já ventilaram a pretensão na ação de extinção de comodato c/c reintegração de posse n. 0301218-63.2019.8.24.0039, na qual foram indeferidos os pedidos liminares; o contrato de comodato celebrado com Volnei permanece válido, de modo que os autores não têm direito ao recebimento das sacas de soja; foram realizadas reuniões com a inventariante, ocasião em que se declinou a impossibilidade de pagar as quantias diretamente a si, vez que o contrato celebrado com Volnei permanece válido e eficaz; a inventariante e os demais herdeiros foram notificados acerca da entrega à Cooperplan das quantias de soja devidas (evento 25, DOC1).
Réplica ofertada (evento 30, DOC1).
No evento 43, DOC1, os autores comunicaram o trânsito em julgado da sentença proferida na ação de extinção de comodato.
Na sentença, o Dr. Lucas Gonçalves Ruiz rejeitou as preliminares, indeferiu o pedido de tutela provisória e julgou procedentes os pedidos iniciais, nos termos do dispositivo a seguir transcrito:
Ante o exposto, julgo PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido autoral para condenar o requerido a pagar a quantia equivalente a 430 sacas de soja para a safra 2017/2018, 430 sacas de soja para a safra 2018/2019 e 430 sacas de soja para a safra 2019/2020, sendo que será adotada para a conversão a cotação vigente na data de 30 de maio de cada ano (2018, 2019 e 2020), de acordo com o índice veiculado pela EPAGRI/CEPA - CENTRO DE SOCIOECONIMIA E PLANEJAMENTO AGRÍCOLA. A correção monetária e os juros de mora incidirão desde a data prevista para cada entrega (30 de maio de cada ano).
A correção monetária e os juros de mora terão incidência nos termos dos arts. 389 e 406 do CC, da seguinte forma em razão das alterações promovidas pela Lei n. 14.905/2024: a) até 29/08/2024, o indexador da correção monetária será o INPC e os juros serão de 1% ao mês; b) a partir de 30/08/2024, a correção monetária e os juros serão fixados conforme a taxa SELIC, deduzindo-se o IPCA/IBGE quando incidir apenas os juros de mora. Tudo conforme Provimento 24/2024 da CGJ/SC e Manual de Adequação de Cálculos.
Considerando a sucumbência mínima dos autores, condeno o réu ao pagamento das custas processuais, bem como de honorários advocatícios, que arbitro em 10% sobre o valor da condenação. (evento 45, DOC1)
Os embargos de declaração opostos (evento 50, DOC1 e evento 53, DOC1) foram rejeitados (evento 60, DOC1).
Irresignado, o réu interpôs apelação cível. Argumentou que: (a) a extinção do contrato de arrendamento não se confunde com sua anulação, de modo que Volnei era legitimado contratualmente a receber as sacas de soja; (b) a cobrança de valores eventualmente recebidos indevidamente por Volnei deve ser realizada contra este, sendo evidente a ilegitimidade passiva; (c) não se poderia imputar ao apelante a obrigação de pagar diretamente aos espólios, pois não havia decisão com trânsito em julgado que invalidasse o contrato firmado com Volnei; (d) a posse dos imóveis dos de cujus foi transmitida aos herdeiros no momento da morte, o que não extingue as relações jurídicas estabelecidas anteriormente; (e) os herdeiros foram regularmente notificados sobre os pagamentos das quantias; (f) não há mora imputável ao apelante; (g) devem ser descontadas as quantias recebidas pelos herdeiros que manifestaram seu recebimento; (h) todos os anos o apelante depositou as verbas devidas em nome de Volnei, tendo comunicado o fato à inventariante e demais herdeiros; (i) não são devidos encargos de mora, pois não houve inadimplemento culposo do recorrente. Ao final, postulou o provimento do recurso (evento 68, DOC1).
Contrarrazões apresentadas (evento 80, DOC1).
Este é o relatório.
VOTO
O recurso merece ser conhecido, porquanto preenchidos os pressupostos de admissibilidade.
Trata-se de ação de obrigação de fazer pela qual os apelados pretendem compelir o apelante à entrega das sacas de soja devidas em decorrência da obrigação assumida em contrato de arrendamento (evento 1, DOC4). Em suma, alegam que, após a celebração do contrato, o apelante não efetuou a entrega das sacas de soja respectivas, de modo que deveria ser compelido a fazê-lo.
Em sua defesa, o apelante alegou que o pagamento já fora realizado, já que procedeu ao depósito das sacas de soja na Cooperativa indicada no contrato, em nome do comodatário das terras e herdeiro Volnei e de outros herdeiros. Ainda, alegou que o pagamento nestes termos deveria ser considerado válido diante da notificação enviada aos demais herdeiros.
O juízo de origem, no entanto, não reconheceu a eficácia liberatória dos depósitos realizados a Volnei e demais herdeiros:
Por consequência, possível concluir que embora Volnei tenha constado como arrendante nos contratos de arrendamento rural, este não figurava mais como comodatário dos imóveis, de modo que as operações foram firmadas tendo unicamente Osmar como arrendante. E sendo assim, a este deveriam ser entregues as sacas de soja, sob pena de descumprimento contratual, na medida em que Volnei não possuía posse sobre os imóveis.
Ainda, é possível se constatar que antes mesmo da entrega das sacas referentes às safras 2017/2018 e 2018/2019 - e, por consequência, 2019/2020 -, já era de conhecimento do réu o falecimento do arrendador Osmar e a controvérsia envolvendo a posse de Volnei em relação à área arrendada, tanto que na notificação extrajudicial que enviou em setembro/2019 (evento 25.3) identificou Osmar como falecido e mencionou a ação n. 0301218-63.2019.8.24.0039, informando que entregaria referidas sacas de maneira proporcional para cada herdeiro. Ademais, o réu foi contranotificado no próprio mês de setembro/2019 (evento 30.2), sendo informado sobre a ação de inventário em andamento envolvendo os bens deixados por Osmar e Maria (processo n. 0300912.31.2018.8.24-0039, evento 15.3), de modo que os pagamentos deveriam ser direcionados ao espólio.
Nesse contexto, estando o réu ciente sobre o imbróglio envolvendo o comodato de Volnei e sobre o inventário em andamento relativo aos bens deixados por Osmar (arrendante) e Maria, deveria ele se acautelar antes de realizar a entrega das sacas referentes ao arrendamento, efetuando o depósito perante o Juízo do inventário ou, se entendesse necessário, ajuizando ação de consignação.
Com vistas adimplir sua obrigação, jamais poderia o réu entregar as sacas com a divisão na proporção que entendia devida entre os herdeiros ou mesmo entregá-las unicamente a Volnei, como assim o fez, de modo que eventuais quitações dispostas nos documentos do evento 25.4 não são invocáveis perante os autores (art. 308 do CC).
Afinal, sendo de conhecimento do réu toda a controvérsia envolvendo a área arrendada e a propriedade das sacas, a boa-fé lhe demandava conduta cautelosa, até porque não sabia qual seria o desfecho das ações que à época estavam em andamento (processos n. 0301218-63.2019.8.24.0039 e 0300912.31.2018.8.24-0039).
O apelante se insurgiu com base nos argumentos acima relatados.
A tese de ilegitimidade passiva merece pronta rejeição. À luz da teoria da asserção, as condições da ação são verificadas a partir da narrativa dos fatos à petição inicial. E tendo em vista que da narrativa autoral se extrai decorrência lógica no pedido de condenação do apelante, não há que falar em ilegitimidade passiva.
No mérito, parcial razão lhe assiste.
A controvérsia central a ser dirimida diz respeito à eficácia, perante o espólio credor, dos pagamentos realizados pelo apelante a Volnei e aos demais herdeiros (evento 25, DOC4), uma vez que, conforme sua defesa, não haveria motivo para não fazê-lo, já que não transitada em julgado a sentença proferida na ação n. 0301218-63.2019.8.24.0039.
O Sr. Volnei Osmar Fernandes foi qualificado como "arrendador inventariante" nos instrumentos contratuais firmados em 24/03/2016 e 24/09/2016. Nos mesmos instrumentos, firmados após o falecimento de Maria Edith (evento 1, DOC5), constou que o imóvel objeto do arrendamento estava vinculado a comodato, do qual beneficiário o Sr. Volnei (evento 1, DOC4). E em ambos os instrumentos, consta a obrigação de depósitos das sacas de soja em nome dos "arrendadores" (cláusula 05).
Também não há prova nos autos de que o apelante tomou ciência do falecimendo de Osmar Fernandes antes de setembro de 2019, quando expressamente manifestou conhecimento da morte em notificação enviada aos herdeiros (evento 25, DOC3).
Ou seja, os depositos realizados em nome de Volnei ou de Osmar anteriormente a setembro de 2019 devem ser reputados válidos, porquanto feitos de boa-fé àqueles que, pelo contrato, aparentavam ser os reais credores da obrigação (os "arrendadores"): O pagamento feito de boa-fé ao credor putativo é válido, ainda provado depois que não era credor (art. 309 do Código Civil).
Nesse sentido, extrai-se da jurisprudência:
APELAÇÃO. AÇÃO DE DESPEJO CUMULADOA COM COBRANÇA. LOCAÇÃO. Sentença de improcedência. Pagamentos realizados à então reconhecida companheira do de cujus. Incidência dos artigos 10 da Lei de Locação e 308 do Código Civil. Alegação do autor de que ela não é inventariante nem herdeira, e ainda está sendo discutida a relação entre ela e o de cujus. Ainda assim, de rigor reconhecer que ela já tinha se apresentado anteriormente, e por várias vezes, junto do de cujus para administração do bem, e se apresentado como sua companheira. Circunstância que autorizava reconhecer que ela era destinatária do aluguel, podendo, na pior das hipóteses, a considerar como credora putativa. Teoria da aparência. Pagamento feito de boa-fé. Aplicação do artigo 309 do Código Civil. Sentença mantida. Recurso não provido. (TJSP; Apelação Cível 1052375-25.2018.8.26.0100; Relator (a): Ana Lucia Romanhole Martucci; Órgão Julgador: 33ª Câmara de Direito Privado; Foro Central Cível - 41ª Vara Cível; Data do Julgamento: 09/08/2021; Data de Registro: 10/08/2021)
LOCAÇÃO DE IMÓVEL – AÇÃO DE DESPEJO POR FALTA DE PAGAMENTO. Os elementos dos autos revelam que a autora não figurou como locadora no contrato de locação. Ausência de prova da partilha de bens do de cujus, a autorizar a tutela do direito pela herdeira. Improcedência da demanda, à luz da teoria da asserção. Validade do pagamento feito de boa-fé (não elidida pelas provas do processo) ao credor putativo, nos termos do art. 309 do Cód. Civil. Despejo prejudicado, haja vista a devolução do imóvel pelo réu. Improcedência mantida. RECURSO DESPROVIDO. (TJSP; Apelação Cível 1002525-39.2019.8.26.0529; Relator (a): Antonio Nascimento; Órgão Julgador: 26ª Câmara de Direito Privado; Foro de Santana de Parnaíba - 1ª Vara Cível; Data do Julgamento: 12/03/2021; Data de Registro: 12/03/2021)
DESPEJO POR FALTA DE PAGAMENTO CONTRATO VERBAL MORTE DO LOCADOR CREDOR APARENTE PAGAMENTO DE BOA-FÉ 1 Pela aplicação da teoria da aparência, é válido o pagamento realizado de boa-fé a credor putativo, devendo ser afastado o pedido de despejo elaborado em face do locatário que, depois da morte do locador, passou a efetuar o pagamento em favor de sua irmã, que se apresentou como herdeira e legítima para receber as quantias; 2 Afastada a validade de documento no qual há informação do nome do atual credor, enviado ao locatário analfabeto, a quem foi supostamente lida a missiva. Documento imprestável a comprovar a má-fé do locatário ou a ciência do nome e qualidade do novo credor. RECURSO IMPROVIDO. (TJSP; Apelação Cível 0010707-56.2012.8.26.0309; Relator (a): Maria Lúcia Pizzotti; Órgão Julgador: 30ª Câmara de Direito Privado; Foro de Jundiaí - 2ª. Vara Cível; Data do Julgamento: 08/04/2015; Data de Registro: 10/04/2015)
Ao contrário do que consignou o juízo a quo, a extinção do contrato de comodato não tem efeitos perante o apelante, porquanto este não integrou a lide em questão. Ademais, como já mencionado, o contrato de arrendamento foi firmado após o falecimento de Maria Edith, de modo que, até a ciência sobre o falecimento de Osmar, não havia qualquer razão para o arrentadário desconfiar da qualidades destes para recebimento dos depósitos.
Portanto, reconheço como válidos, exonerando parcialmente o apelante, os seguintes depósitos:
278 sacas (16.680 kg) de soja, depositados em 07/07/2017 para Volnei Osmar Fernandes (evento 25, DOC4, p. 6);227,33 sacas (13.640 kg) de soja, depositados em 07/07/2017 para Osmar Fernandes (evento 25, DOC4, p. 5).
Os pagamentos realizados posteriormente não podem exonerar o apelante, vez que já detinha conhecimento do falecimento de Osmar. Ou seja, a partir do conhecimento do falecimento, o apelante já detinha ciência de que somente poderia pagar a quem o representasse (art. 308 do Código Civil), especialmente porque, diante da condição contratual arrendante de Volnei - decorrente da posição de comodatário do imóvel -, seria decorrência da morte de Osmar a extinção do comodato, independentemente do trânsito em julgado da ação n. 0301218-63.2019.8.24.0039.
Não bastasse, não há prova segura de que a notificação do evento 25, DOC3 foi efetivamente recebida pelos demais herdeiros e de que estes concordaram com seus termos. Da própria notificação se extrai que o apelante pediu a concordância expressa dos herdeiros para proceder ao depósito da soja em seu nome: "4.2 Serve, igualmente, para comunicar a Vossas Senhorias de que, desde que concordem expressamente, em que [...]".
E, como terceira razão para não reconhecer estes pagamentos, verifica-se que os depósitos foram imputados a apenas parte dos herdeiros, e em quantias não idênticas (evento 25, DOC4). Portanto, conceder efeito liberatório em relação a estes pagamentos não prejudicaria apenas o espólio, mas também seus herdeiros individualmente, já que o acerto dos bens recebidos em inventário poderia implicar desequilíbrio na partilha.
Não se descuida da transferência uti universi de todo os bens e direitos do falecido à data da abertura da sucessão (art. 1.784 do Código Civil), o que, no entanto, não enseja reconhecer a eficácia dos atos de disposição praticados pelos herdeiros de maneira singular (art. 1.793, § 3º). Evidente que eventual recebimento indevido, pelo herdeiro, de valores/coisas devidas ao espólio pode configurar o dever de indenizar terceiros de boa-fé (arts. 876 e 884), o que, por certo, não prejudica o crédito do acervo hereditário.
Sobre o tema, e mutatis, mutandis:
APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. TERMO ADITIVO EM DISTRATO CONTRATUAL COM CLÁUSULA DE ASSUNÇÃO DA DÍVIDA POR TERCEIRO ANUENTE EM CONJUNTO COM SÓCIO RETIRANTE. ALEGADA ILEGITIMIDADE E INEXEGIBILIDADE DO TÍTULO EM RELAÇÃO AO TERCEIRO INTERVENIENTE. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. RECURSO DO TERCEIRO, ORA EMBARGANTE, QUE ALEGA INEXIBIBILIDADE DO TÍTULO E ILEGITIMIDADE PASSIVA. 1 - APELANTE QUE EFETUOU O PAGAMENTO AO SEU CREDOR PRIMITIVO, NÃO SENDO POSSÍVEL COGITAR TÊ-LO REALIZADO DE BOA-FÉ, PORQUE CIENTE DO ACORDO EXPRESSAMENTE FIRMADO E DA CLÁUSULA DE ASSUNÇÃO DO DÉBITO. NOTIFICAÇÃO POSTERIOR DO CREDOR ORIGINÁRIO PARA NÃO PAGAMENTO INEFICAZ. INAPLICABILIDADE DO ART. 309 DO CÓDIGO CIVIL À ESPÉCIE. EXIGIBILIDADE DO DÉBITO E LEGITIMIDADE DO APELANTE PARA FIGURAR NO POLO PASSIVO DA EXECUÇÃO. "[...] Figura do credor putativo que não se amolda à espécie. Quem paga mal, paga duas vezes, facultado o acerto em demanda autônoma e regressiva. Arts. 309 e 310 do CC. [...]." (TJSP; Apelação Cível 1071400-85.2022.8.26.0002; Relator (a): Ferreira da Cruz; Órgão Julgador: 28ª Câmara de Direito Privado; Foro Regional II - Santo Amaro - 10ª Vara Cível; Data do Julgamento: 15/05/2023; Data de Registro: 15/05/2023). [...] (TJSC, Apelação n. 5077529-97.2020.8.24.0023, do , rel. Dinart Francisco Machado, Terceira Câmara de Direito Comercial, j. 02-05-2024).
Portanto, tenho que o recurso merece parcial provimento a fim de descontar, do montante devido, as quantias referidas acima.
Para fins de desconto no crédito, o valor de cada saca de soja (278 em 07/07/2017 e 227,33 em 07/07/2017) corresponderá àquele correspondente à cotação vigente na data do respectivo depósito de acordo com o índice veiculado pela EPAGRI/CEPA - Centro de Socioeconimia e Planejamento Agrícola, nos termos da sentença.
Embora não caracterize doação, as sacas de soja recebidas pelo herdeiro Volnei deverão ser objeto de colação, nos termos da Lei (arts. 2.002 e seguintes do Código Civil), o que deverá ser postulado perante o juízo sucessório.
Pela leitura da petição inicial, deflagra-se que o pedido condenatório correspondeu à entrega de 1.290 sacas de soja. Após o julgamento na instância recursal, a parte autora sagrou-se vencedora em relação a aproximadamente 60% dos pedidos, de modo que se verifica sucumbência recíproca, na forma do art. 86, do Código de Processo Civil. Em razão disso, deve a parte demandante suportar 40% das despesas processuais e a parte ré os 60% remanescentes.
Quanto aos honorários advocatícios, o CPC, em seu art. 85, §§ 2º, 8º e 8-A, estabeleceu uma ordem preferencial de base de cálculo para o respectivo arbitramento, a saber: condenação, proveito econômico e valor da causa, com a ressalva de que, em sendo inestimável ou irrisório o proveito econômico ou muito baixo o valor da causa, ser viável a apreciação equitativa.
Ao deliberar sobre o alcance da norma contida no § 8º do art. 85 do CPC nas causas em que o valor da causa ou o proveito econômico da demanda forem elevados, o Superior TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Apelação Nº 5008868-18.2020.8.24.0039/SC
RELATOR: Desembargador EDUARDO GALLO JR.
EMENTA
Ementa: DIREITO CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. VALIDADE DOS PAGAMENTOS REALIZADOS A CREDOR PUTATIVO. PARCIAL PROVIMENTO.
I. CASO EM EXAME
1. Apelação cível interposta contra sentença que julgou parcialmente procedente os pedidos para condenar o requerido ao pagamento do valor correspondente às sacas de soja.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
2. Há duas questões em discussão: (i) saber se o apelante é parte passiva ilegítima para responder aos pedidos; (ii) saber se os depósitos de soja realizados pelo apelante aos herdeiros tem efeito liberatório.
III. RAZÕES DE DECIDIR
3. À luz da teoria da asserção, as condições da ação são verificadas a partir da narrativa dos fatos à petição inicial. E tendo em vista que da narrativa autoral se extrai decorrência lógica no pedido de condenação do apelante, não há que falar em ilegitimidade passiva.
4. O pagamento realizado de boa-fé a credor putativo é válido. Dessa forma, os depósitos de soja feitos antes da ciência inequívoca de falecimento do arrendante em nome do herdeiro comodatário, o qual também constou como arrendante no contrato, são válidos e liberam o arrendatário de novo pagamento.
5. A partir do conhecimento do falecimento, o apelante deveria ter direcionado os pagamentos ao espólio, não podendo se considerar válidos os depósitos realizados posteriormente aos herdeiros sem a concordância expressa dos demais.
6. A transferência uti universi de todos os bens e direitos do de cujus à data da abertura da sucessão não enseja reconhecer a eficácia dos atos de disposição praticados pelos herdeiros de maneira singular. Eventual recebimento indevido, pelo herdeiro, de valores/coisas devidas ao espólio pode configurar o dever de indenizar terceiros de boa-fé, o que não prejudica o crédito do acervo hereditário.
IV. DISPOSITIVO E TESE
7. Recurso conhecido e parcialmente provido.
___________
Dispositivos relevantes citados: Código Civil, arts. 308, 309, 1.784, 1.793.
Jurisprudência relevante citada: TJSP, Apelação Cível n. 1052375-25.2018.8.26.0100, Rel. Ana Lucia Romanhole Martucci, 33ª Câmara de Direito Privado, j. 09/08/2021.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Câmara de Direito Civil do decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 11 de novembro de 2025.
assinado por EDUARDO MATTOS GALLO JUNIOR, Desembargador, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 6873065v4 e do código CRC e3459457.
Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): EDUARDO MATTOS GALLO JUNIOR
Data e Hora: 12/11/2025, às 10:52:27
5008868-18.2020.8.24.0039 6873065 .V4
Conferência de autenticidade emitida em 18/11/2025 02:15:10.
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Extrato de Ata EXTRATO DE ATA DA SESSÃO ORDINÁRIA FÍSICA DE 11/11/2025
Apelação Nº 5008868-18.2020.8.24.0039/SC
RELATOR: Desembargador EDUARDO GALLO JR.
PRESIDENTE: Desembargador EDUARDO GALLO JR.
PROCURADOR(A): ANTENOR CHINATO RIBEIRO
SUSTENTAÇÃO ORAL POR VIDEOCONFERÊNCIA: NELSO POZENATO por T. R. M.
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Ordinária Física do dia 11/11/2025, na sequência 13, disponibilizada no DJe de 27/10/2025.
Certifico que a 6ª Câmara de Direito Civil, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 6ª CÂMARA DE DIREITO CIVIL DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador EDUARDO GALLO JR.
Votante: Desembargador EDUARDO GALLO JR.
Votante: Desembargador MARCOS FEY PROBST
Votante: Desembargador JOAO DE NADAL
NEUZELY SIMONE DA SILVA
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 18/11/2025 02:15:10.
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