Decisão TJSC

Processo: 5029807-80.2024.8.24.0038

Recurso: recurso

Relator: Desembargador EDUARDO GALLO JR.

Órgão julgador: Turma, julgado em 21/3/2022, DJe de 30/3/2022; AgRg no REsp 577.899/PR, Segunda Turma, Rel. Ministro Castro Meira, DJe 21/5/2008; REsp 1.252.076/MG, Segunda Turma, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, DJe 11/10/2012.

Data do julgamento: 19 de dezembro de 2006

Ementa

RECURSO –  DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. REPONSABILIDADE CIVIL. ATO ILÍCITO. NEXO DE CAUSALIDADE. DEVER DE MITIGAR O PRÓPRIO PREJUÍZO. DESPROVIMENTO. I. CASO EM EXAME 1. Apelação cível contra sentença que julgou improcedente o pedido de condenação do requerido ao pagamento de indenização por dano material. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há duas questões em discussão: (i) saber se o requerido cometeu ato ilícito; e (ii) saber se há nexo de causalidade entre a conduta do réu e o dano alegado pela autora. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. O requerido inseriu em sua Declaração de Imposto de Renda de Pessoa Física informações relativas a doações efetuadas em favor da autora, o que levou ao Fisco Estadual a identificar a ocorrência de fato gerador de ITCMD, e, posteriormente, à propositura de ação fiscal.  4. Não há prova da ilicitude da conduta do réu, porque a autora deixou de demonstrar que ...

(TJSC; Processo nº 5029807-80.2024.8.24.0038; Recurso: recurso; Relator: Desembargador EDUARDO GALLO JR.; Órgão julgador: Turma, julgado em 21/3/2022, DJe de 30/3/2022; AgRg no REsp 577.899/PR, Segunda Turma, Rel. Ministro Castro Meira, DJe 21/5/2008; REsp 1.252.076/MG, Segunda Turma, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, DJe 11/10/2012.; Data do Julgamento: 19 de dezembro de 2006)

Texto completo da decisão

Documento:6904604 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA Apelação Nº 5029807-80.2024.8.24.0038/SC RELATOR: Desembargador EDUARDO GALLO JR. RELATÓRIO K. R. O. propôs "ação indenizatória", perante o Juízo da 4ª Vara Cível da Comarca de Joinville, contra C. E. G.. Na inicial, narrou que foi casada com o requerido, pelo regime da comunhão parcial de bens, entre 2006 e 2010, quando a união foi desfeita de forma consensual, com a partilha de bens pela via extrajudicial, perante o 2º Tabelionato de Notas de Joinville, pela qual coube à autora: (i) a quantia de R$ 250.000,00, depositados na conta poupança nº 97.915-5, agência 3420-7, Unicred; (ii) um automóvel Peugeot/207, avaliado em R$ 40.000,00; (iii) o valor das contribuições depositadas em nome da autora junto à Quanta Previdência Unicred até a data da partilha; e (iv) um imóvel de matrícula n. 70.680 do 1º ORI de Joinville. Relatou que foi instada pela Receita Estadual de Santa Catarina a promover o pagamento da quantia de R$ 47.798,30, referente a alíquota de ITCMD incidente sobre a base de cálculo de R$ 379.600,00, correspondentes aos valores depositados em conta poupança, da avaliação do automóvel e do imóvel, além da multa de 75% em razão do inadimplemento. Argumentou que o débito ocorreu em razão da análise do Fisco Estadual das informações inseridas pelo réu em sua DIRPF do ano-calendário de 2010, em que inseriu declaração de doação dos bens que couberam à autora por decorrência da separação. Alegou que foi executada nos autos da execução fiscal n. 0901940-67.2017.8.24.0023, e que apresentou defesa na forma de exceção de pré-executividade, em que explicou que nunca houve doação, e sim partilha de bens comuns, mas o juízo rejeitou e, mesmo após interposição de recurso, a decisão foi mantida, sob o fundamento de que prevaleceria aquilo que foi declarado pelo réu. Aduziu que sofreu grave prejuízo em razão de bloqueio de bens e valores, sendo obrigada a realizar o parcelamento da dívida, no total de R$ 65.205,08, que vem sendo regularmente pago. Asseverou que o réu, por negligência ou imprudência, declarou de maneira incorreta a doação do patrimônio comum do casal, causando prejuízo à autora, de modo que é devida a reparação de danos. Ao final, requereu a gratuidade da justiça e a procedência dos pedidos, para que o réu seja condenado a indenizar a autora no montante de R$ 65.205,08, acrescido de correção monetária e juros (evento 1, DOC1). Determinada a comprovação da hipossuficiência (evento 4, DOC1), a autora apresentou documentos (evento 7, DOC1), mas a gratuidade da justiça foi indeferida (evento 9, DOC1). Citada, a parte ré ofereceu contestação, alegando que apenas tomou ciência dos fatos quando citado na presente demanda, tendo em vista que, quando do lançamento do ITCMD pela Receita Estadual, em 2017, a autora foi devidamente notificada e teve oportunidade de impugnar o ato administrativo, podendo inclusive solicitar a retificação da declaração de IRPF do réu ou oportunizar sua manifestação na esfera administrativa, o que não ocorreu. Ademais, na execução, insurgiu-se mediante exceção de pré-executividade, que não admite exame de mérito da causa. Argumentou que a autora não demonstrou o nexo de causalidade entre a cobrança pelo Fisco e declaração incorreta pelo réu, tendo em vista que há decisão administrativa e judicial confirmando a legalidade do imposto lançado. Sustentou que a responsabilidade tributária decorre de ato da Receita Estadual, não se podendo imputar ao réu a responsabilidade civil por ato da Administração Tributária, mesmo porque o nexo causal foi rompido também pelas decisões judiciais que mantiveram a cobrança. Em sede preliminar, argumentou que a pretensão indenizatória da requerente foi atingida pela prescrição, tendo em vista que o débito foi inscrito em dívida ativa em 02/03/2017, momento em que já tinha conhecimento do lançamento do ITCMD, ao passo que a presente demanda foi ajuizada apenas em 09/07/2024, quando consumado o prazo prescricional de três anos. No mérito, defendeu a ausência de ato ilícito, pois em caso de equívoco na declaração do réu, deveria a autora ter promovido a retificação do documento fiscal, além de que seus argumentos foram insuficientes para afastar a cobrança. Aduziu que renunciou a parcela significativa de seus bens para viabilizar o divórcio, o que caracteriza transferência gratuita de patrimônio, que os dados inseridos na DIRPF retratam a realidade dos fatos e não podem ser caracterizados como ato ilícito, ao passo que a autora não demonstrou a aquisição dos bens na constância do matrimônio. Argumentou que não foi demonstrado o nexo de causalidade entre a conduta do réu e o dano, tendo em vista que a constituição de crédito tributário foi realizada pelo Fisco Estadual, bem como porque não se aplicam as hipóteses em que terceiro, alheio ao fato gerador, pode ser responsabilizado pelo pagamento do tributo. Aduziu que, ainda que existisse erro na declaração do IRPF, não há indício de dolo, má-fé ou culpa grave, mas equívoco de natureza técnica ou interpretativa, o que não caracteriza ato ilícito. Acrescentou que não há dano a ser indenizado, tendo em vista que o débito inicial foi de R$ 22.172,00, e que só evoluiu em razão da inadimplência, bem como porque a adesão ao parcelamento implica em reconhecimento da existência da dívida. Concluiu que não foi permitida a manifestação do requerido durante o processo administrativo de cobrança, o que possibilitaria ao réu a apresentação de defesa acerca da responsabilidade pela cobrança do ITCMD. Postulou pela improcedência (evento 44, DOC2). Réplica ofertada, em que a autora rechaçou a preliminar de prescrição, tendo em vista que o prejuízo só foi suportado com a adesão ao parcelamento, o que ocorreu em 2023/2024 pela frustação dos demais meios de defesa. No mérito, defendeu que os bens foram recebidos em razão da partilha decorrente do divórcio, e que a declaração como doação gerou consequências tributárias indevidas. Argumentou que não se imputa ao réu responsabilidade tributária, e sim civil, pelo dano causado à autora em razão de sua declaração inverídica. Argumentou que a conduta caracteriza ato ilícito, pois o lançamento do tributo se originou das informações falsas prestadas pelo réu, e que o parcelamento foi necessária porque a inadimplência lhe geraria consequências graves, mas o seu pagamento não exclui a responsabilidade do verdadeiro causador do dano (evento 47, DOC1). Na sentença, o Dr. Luís Paulo Dal Pont Lodetti julgou improcedentes os pedidos iniciais, nos termos do dispositivo a seguir transcrito: Diante do exposto, julgo improcedente o pedido, condenando a autora ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) do valor da causa (art. 85, § 2º do CPC). Publique-se. Registre-se. Intimem-se (evento 50, DOC1). Irresignada, a autora interpôs apelação cível. Alega, em suas razões, que: (i) é inequívoca a ocorrência do dano, tendo em vista que o débito fiscal decorre de conduta ilícita do réu; (ii) não há como condicionar o direito à indenização ao prévio e integral exercício da defesa na execução fiscal, pois imputa à vítima ônus processual desproporcional e sem garantia de êxito; (iii) a responsabilidade por insurgência contra a autuação fiscal e exigência de ITCMD não pode ser transferida à autora, pois foi vítima da conduta do réu, que deve manejar os instrumentos administrativos ou judiciais pertinentes para questionar a exigência tributária e pleitear a restituição dos valores pagos; (iv) o postulado do duty to mitigate the loss não pode ser usado para afastar a responsabilidade do causador do dano, tendo em vista que a autora opôs exceção de pré-executividade para discutir a exigibilidade do débito; (v) a adesão ao parcelamento ocorreu por necessidade da autora, e não exclui a responsabilidade do réu. Postulou pelo provimento do recurso e reforma da sentença, para que seja o réu condenado ao pagamento de indenização no valor de R$ 65.205,08 (evento 59, DOC1). Contrarrazões apresentadas (evento 66, DOC1). Este é o relatório. VOTO O recurso merece ser conhecido, porquanto preenchidos os pressupostos de admissibilidade. As partes foram casadas pelo regime da comunhão parcial de bens até 2010, quando a união foi desfeita de forma consensual (evento 1, DOC6), época em que as partes firmaram "Partilha Amigável", perante o 2º Tabelionato de Notas de Joinville, por meio da qual teriam efetuado a divisão dos bens comuns, dos quais foram destinados à autora: (i) a quantia de R$ 250.000,00, depositada na conta poupança nº 97.915-5, agência 3420-7, Unicred; (ii) um automóvel Peugeot/207, avaliado em R$ 40.000,00; (iii) o valor das contribuições depositadas em nome da autora junto à Quanta Previdência Unicred até a data da partilha; e (iv) um imóvel de matrícula n. 70.680 do 1º ORI de Joinville (evento 1, DOC7). Sustenta a apelante que, não obstante a partilha amigável, na declaração de IRPF entregue pelo requerido, referente ao ano-calendário de 2010, inseriu informação de doações em seu favor das quantias de R$ 24.000,00, R$ 250.000,00, R$ 40.000,00 e R$ 89.600,00, que seriam referentes aos bens que lhe foram destinados. Por consequência, a Receita Estadual a considerou como devedora do ITCMD correspondente, sendo instada ao pagamento da quantia de R$ 47.798,40, que inclui também multa de 75% em razão do inadimplemento. Posteriormente, o débito foi inscrito em dívida ativa e deu causa à instauração da execução fiscal n. 0901940-67.2017.8.24.0023, em que foi rejeitada a exceção de pré-executividade apresentada pela executada, ora autora, razão pela qual aderiu a parcelamento fiscal, e está efetuando o pagamento do débito, que totaliza R$ 65.205,08. Em razão dos prejuízos suportados, a autora propôs a presente ação de reparação civil em face do requerido, sustentando que a declaração inverídica de doação dos bens comuns, prestada por este em sua declaração de imposto de renda, configura ato ilícito nos termos do art. 186 e 927 do Código Civil, o qual deu causa à indevida exigência tributária e consequente dano material. Nesse contexto, a alegação de que a conduta do requerido configura ato ilícito exigiria a demonstração inequívoca de que as declarações prestadas por ele à Receita Federal são falsas no que tange à natureza da transferência dos bens, que, segundo a autora, teriam sido destinados por força da meação decorrente da dissolução do vínculo conjugal, e não por liberalidade.  Desde já, consigno que a partilha patrimonial foi formalizada por instrumento particular, em desacordo com a forma exigida pelo artigo 1.124-A do Código de Processo Civil de 1973, então vigente, que impunha a escritura pública como requisito de validade da disposição consensual de bens comuns. A ausência dessa formalidade legal configura vício de forma, ensejando a nulidade do negócio jurídico, nos termos do artigo 104, inciso III, do Código Civil. Assim já decidiu este Tribunal: APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DE FAMÍLIA. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. RECURSO DO RÉU.   PRETENSA REFORMA DO JULGADO. ACOLHIMENTO. PARTILHA REALIZADA EM ACORDO EXTRAJUDICIAL POR INSTRUMENTO PARTICULAR. NULIDADE. DESRESPEITO À FORMA LEGAL. INVALIDADE ABSOLUTA. INCIDÊNCIA DO ART. 1.124-A DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973 (ART. 733 DO ATUAL CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL). DISCUSSÃO PATRIMONIAL EM DECORRÊNCIA DA DISSOLUÇÃO DA UNIÃO ESTÁVEL QUE DEVE SER RELEGADA À AÇÃO PRÓPRIA. SENTENÇA REFORMADA.    RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.   - "Considerando que o "Termo de Acordo de Partilha de Bens e Obrigações Resultantes de Sociedade Conjugal" não observou a forma prescrita em lei, a teor do que determina o artigo 1.124 do CPC/73, correspondente ao art. 733 do CPC/15, impõe-se manter a sentença que reconheceu a nulidade absoluta do acordo" (TJRS, Apelação Cível n. 70070073754, rel. Des. Voltaire de Lima Moraes)  - "Tendo em vista a aplicação das normas de direito de família à união estável, carece de possibilidade jurídica o pedido de condenação para que o ex-companheiro e pai dos autores desonere o imóvel de penhora superveniente, fundado em "partilha informal", diante da inobservância dos requisitos legais para partilha extrajudicial, como escritura pública e assistência de advogado ou defensor, de acordo com o artigo 1.124-A do CPC, aplicável à união estável por analogia" (TJSC, Apelação Cível n. 2014.080602-7, rel. Des. Henry Petry Junior, Quinta Câmara de Direito Civil). (TJSC, Apelação Cível n. 0000324-75.2014.8.24.0027, rel. Des. Rubens Schulz, Segunda Câmara de Direito Civil, j. 18-06-2020). Não se olvida que o requerido também declarou, na seção de "Bens e Direitos", que o apartamento n. 703 do Edifício Monaliza e o veículo Peugeot/207 foram transferidos para a autora em razão da partilha de bens decorrentes da separação judicial, e os valores dos referidos bens em 31/12/2009 eram R$ 89.600,00 e R$ 40.000,00, ou seja, quantias idênticas a duas das supostas doações que teria realizado em favor da autora. Pode-se presumir que essa coincidência represente um equívoco do requerido, que incorretamente duplicou declarações relativas aos mesmos bens. O documento não corrobora, no entanto, com a tese da parte autora, no sentido de que não houve transmissão gratuita de bens, tendo em vista que o patrimônio que lhe coube após o divórcio era comum ao casal. Importante registrar que, em casos de excesso de partilha, isso é, quando um dos cônjuges recebe valor superior à sua meação, o excedente caracteriza fato gerador para o ITCMD. Colhe-se da Corte Superior: PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. ITCMD. ACÓRDÃO EM CONFRONTO COM A JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE. DESPROVIMENTO DO AGRAVO INTERNO. MANUTENÇÃO DA DECISÃO RECORRIDA. I - Na origem trata-se de agravo de instrumento contra decisão que, deferiu a produção de prova testemunhal, mas rejeitou o pedido de decadência. No Tribunal a quo a decisão foi reformada. II - O Tribunal a quo, analisando a questão, entendeu, em suma, que a sentença que homologou a separação e a partilha constitui o fato gerador para a contagem da decadência do art. 173, I do CTN. III - No seu recurso especial o Estado de Pernambuco alegou ofensa ao art. 1.245 do CC e art. 173, I, do CTN, argumentando, em resumo, que o fato gerador para contagem do prazo decadencial ocorre com o registro dos bens imóveis no cartório. IV - Entretanto, ao realizar uma análise comparativa entre o acórdão proferido pelo Tribunal a quo e os argumentos apresentados no recurso especial, verifica-se que o imposto foi lançado pela ocorrência de suposta doação por meio de excesso de partilha. V - Independentemente, da natureza dos bens doados, os quais não são especificados no Tribunal a quo, verifica-se que tratando-se de partilha de bens, o fato gerador ocorre com a homologação da sentença de partilha, não sendo necessário para o início da contagem decadencial a ciência do Estado, sobre a existência do fato gerador. No mesmo sentido: AgInt no AREsp n. 1.761.748/PR, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 21/3/2022, DJe de 30/3/2022; AgRg no REsp 577.899/PR, Segunda Turma, Rel. Ministro Castro Meira, DJe 21/5/2008; REsp 1.252.076/MG, Segunda Turma, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, DJe 11/10/2012. VI - Agravo interno improvido. (STJ, AgInt no AgInt nos EDcl no AREsp n. 2.372.141/PE, rel. Min. Francisco Falcão, Segunda Turma, j. 7/10/2024 - grifei). Conclui-se, pois, que sequer há elementos probatórios suficientes para demonstrar que a conduta do requerido constituiu ato ilícito, tendo em vista a nulidade do instrumento particular de partilha evento 1, DOC7), aliado à possibilidade de que a transmissão tenha constituído fato gerador do ITCMD em razão de excesso de meação, hipótese em que a pretensão da requerente seria improcedente. Por outro lado, ainda que se admitisse eram falsas as doações indicadas pelo requerido no Declaração de Imposto de Renda de Pessoa Física referente ao ano-calendário de 2010, a pretensão indenizatória da autora não poderia ser acolhida, por ausência de nexo de causalidade entre a conduta e o dano alegadamente suportado. Com efeito, a autuação administrativa da autora para pagamento do tributo, acrescido de multa por inadimplemento só ocorreu em razão das declarações do requerido, que, foram compartilhadas com o Fisco estadual, e que, por sua vez, identificou a ocorrência de fato gerador de ITCMD. Todavia, entendo que após a lavratura do auto de infração, a conduta omissiva da autora foi determinante para culminar na efetiva ocorrência do dano alegado, consistente na adesão ao parcelamento e pagamento do débito, suficiente para caracterizar rompimento do nexo de causalidade com o ato ilícito imputado ao réu, configurando fato exclusivo da vítima. Nesse tópico, assim lecionam Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald: No setor da responsabilidade civil, o nexo causal exercita duas funções: a primeira (e primordial) é a de conferir a obrigação de indenizar aquele cujo comportamento foi a causa eficiente para a produção do dano. Imputa-se juridicamente as consequências de um evento lesivo a quem os produziu (seja pela culpa ou risco, conforme a teoria que se adote). A seu turno, a segunda função será a de determinar a extensão deste dano, a medida de sua reparação. Ou seja, pela relação da causalidade seremos capazes de determinar quem repara o dano e quais os efeitos danosos serão reparados. [...] Se eventualmente a própria vítima se coloca em condições de sofrer um dano, havendo necessária relação entre o seu comportamento e as lesões daí decorrentes, surgirá a excludente do nexo causal do fato exclusivo da vítima. Nesses casos o agente será apenas um aparente responsável, servindo como simples instrumento para a conflagração do evento lesivo (Curso de Direito Civil: responsabilidade civil. 9. ed. rev. e atual. Salvador: Ed. JusPodivm, 2022, p.  466-491). No caso, a autora foi omissa ainda na fase administrativa, quando, ao ser notificada da autuação, deixou de apresentar defesa alegando a inocorrência do fato gerador da doação, demonstrando que os bens lhe foram destinados em razão do divórcio e subsequente partilha. Como consequência, houve inscrição em dívida ativa e subsequente propositura da ação de execução fiscal n. 5029807-80.2024.8.24.0038, em que a executada opôs exceção de pré-executividade, que todavia, foi rejeitada em razão da incompatibilidade da via eleita com a matéria aventada, que exigiria a produção de prova acerca da não incidência do ITCMD (evento 1, DOC12, p. 65-68): In casu, a matéria aventada pela parte executada não pode ser discutida pela via da exceção de pré-executividade, uma vez que se faz necessária dilação probatória para análise adequada da tese de inexigibilidade do ITCMD, em razão da suposta divisão amigável de bens entre a parte excipiente e seu ex-marido, por ocasião do divórcio entre as partes. [...] Pela leitura dos dispositivos legai supracitados, em especial o disposto no art. 2º, § 4º, da Lei Estadual n. 13.136/04, entende-se que o ITCMD será devido, nos casos de partilha de bens entre cônjuges ou companheiros quando o valor percebido por um dos partilhantes for superior ao valor que lhe cabia pela meação, quando se tratar de patrimônio comum. Caso se trate de bens particulares que venham a ser destinados por um cônjuge ao outro, por óbvio, há incidência do ITCMD, eis que tais bens não compunham a comunidade de bens do casal. O patrimônio comum, na hipótese de casamento sob o regime de comunhão parcial de bens, corresponde àquele adquirido na constância da união estável, por quaisquer dos cônjuges, nos moldes do art. 1.658 do Código Civil. Os demais bens, previstos nas hipóteses do art. 1.659 do aludido diploma legal, ficam excluídos da comunhão de bens. É o caso, por exemplo, daqueles bens que os cônjuges possuíam antes do casamento, seus proventos de trabalhos pessoais ou bens de uso pessoal. Na hipótese dos autos, o termo de partilha amigável apresentado pela parte excipiente demonstra que esta e seu ex-cônjuge possuíam um imóvel, dois automóveis, valores depositados em várias contas bancárias, cotas sociais da empresa ALEF Serviços de Ortopedia S/A e valores de contribuições previdenciárias (p. 23-25). A partilha de tais bens, inclusive, consta nas declarações do IRPF de C. E. G., referentes aos exercícios de 2010 e 2011 (p. 26-37) Entretanto, não há comprovação alguma da data em que tais bens foram adquiridos se durante a vigência da sociedade conjugal ou antes dela -, tampouco do valor efetivo de boa parte dos valores depositados em conta bancária, ou mesmo da avaliação das cotas empresariais que ficaram com o ex-marido da excipiente. Sem essas informações, não é possível verificar se o patrimônio deixado com a excipiente de fato correspondia à meação e até mesmo se o seu valor foi igual a esta ou superior. Isto é, a mera menção à divisão de bens entre as partes não é o bastante para afastar a incidência do ITCMD, já que, caso a parte executada tenha recebido bens que não faziam parte da meação ou em valor superior a ela, é devido o pagamento do tributo em questão. Consequentemente, não há como ser acolhida a tese defensiva ora examinada, ao menos por meio de exceção de pré-executividade, já que há necessidade de apresentação de novas provas para o exame aprofundado do caso. E, como visto anteriormente, tal medida é inviável pela via escolhida pela parte excipiente A decisão foi mantida pelos mesmos fundamentos por este Tribunal, em sede de agravo de instrumento (evento 1, DOC13, p. 52-55), e, em seguida, a executada aderiu ao parcelamento fiscal (evento 1, DOC12, p. 153) e propôs a presente demanda. Na execução, o meio de defesa adequado para conhecimento da matéria alegada era os embargos à execução, tendo em vista que a exceção de pré-executividade é reservada para a alegação de vícios formais e matérias de ordem pública. Conclui-se, pois, que a atuação da requerente, tanto na fase administrativa quanto judicial, foi ineficiente no sentido de evitar a ocorrência do dano, tendo em vista que não empreendeu mínimos esforços para afastar a exigibilidade do crédito tributário. Certo que não poderia se exigir da autora o esgotamento de todos os mecanismos de defesa e recurso possíveis para pleitear a responsabilização do alegado causador do dano. No entanto, deveria ao menos buscar evitar a ocorrência do prejuízo, mediante utilização de meio de impugnação viável à discussão do mérito da questão, seja a defesa administrativa ou os embargos à execução, em que seria possível a produção da prova da inocorrência do fato gerador. Ora, caso as alegações da autora sejam mesmo verdadeiras e os bens que lhe foram destinados na partilha constituíam patrimônio comum do casal, bastava a comprovação dessa circunstância ao Fisco para evitar a inscrição em dívida ativa, ou então ao juízo competente, para que a execução fiscal fosse extinta pela ausência de fato gerador. Portanto, apesar de a autuação fiscal ter sido causada pela declaração prestada pelo réu, foi o comportamento omissivo e desidioso da autora a causa eficiente para a ocorrência do dano, consistente no parcelamento e pagamento da dívida. Como bem observado pelo magistrado de primeiro grau, a conduta revela violação à boa-fé objetiva, especialmente no tocante ao princípio do duty to mitigate the loss, que impõe à parte lesada o dever de adotar medidas razoáveis para evitar a ocorrência ou agravamento do dano, na medida em que a autora deliberadamente utilizou de meio de defesa inócuo para ilidir a cobrança de tributo, buscando apenas transferir a responsabilidade do pagamento ao réu.  A aplicação do referido postulado não importa na isenção do dever de reparação do dano por quem o tenha causado, e sim instrumento para reconhecer que o comportamento contrário à boa-fé da autora acarretou no rompimento do nexo de causalidade, o que afasta a responsabilidade civil do requerido.  Assim, seja por não ter sido demonstrado ato ilícito do requerido ou pela ausência de nexo de causalidade com o dano, a pretensão indenizatória da autora não comporta acolhimento, de modo que a sentença proferida pelo Dr. Luiz Paulo Dal Pont Lodetti não merece reparos, devendo ser integralmente mantida. Por fim, quanto aos honorários recursais, o STJ assentou no tema n. 1.059 que: A majoração dos honorários de sucumbência prevista no art. 85, § 11, do CPC pressupõe que o recurso tenha sido integralmente desprovido ou não conhecido pelo tribunal, monocraticamente ou pelo órgão colegiado competente. Não se aplica o art. 85, § 11, do CPC em caso de provimento total ou parcial do recurso, ainda que mínima a alteração do resultado do julgamento ou limitada a consectários da condenação. No caso, ante a rejeição da totalidade dos pedidos recursais, é devido o arbitramento de remuneração recursal ao patrono da parte apelada. Para tanto, majoro o estipêndio que lhe foi fixado na origem, isso é 10% do valor da causa - cujo critério não foi impugnado pelas partes - em 5%, totalizando o importe de 15%. Pelo exposto, voto no sentido de conhecer e negar provimento ao recurso de apelação. assinado por EDUARDO MATTOS GALLO JUNIOR, Desembargador, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 6904604v55 e do código CRC 067cbec6. Informações adicionais da assinatura: Signatário (a): EDUARDO MATTOS GALLO JUNIOR Data e Hora: 12/11/2025, às 10:52:26     5029807-80.2024.8.24.0038 6904604 .V55 Conferência de autenticidade emitida em 16/11/2025 16:27:51. Identificações de pessoas físicas foram ocultadas Documento:6904605 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA Apelação Nº 5029807-80.2024.8.24.0038/SC RELATOR: Desembargador EDUARDO GALLO JR. EMENTA EMENTA: DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. REPONSABILIDADE CIVIL. ATO ILÍCITO. NEXO DE CAUSALIDADE. DEVER DE MITIGAR O PRÓPRIO PREJUÍZO. DESPROVIMENTO. I. CASO EM EXAME 1. Apelação cível contra sentença que julgou improcedente o pedido de condenação do requerido ao pagamento de indenização por dano material. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há duas questões em discussão: (i) saber se o requerido cometeu ato ilícito; e (ii) saber se há nexo de causalidade entre a conduta do réu e o dano alegado pela autora. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. O requerido inseriu em sua Declaração de Imposto de Renda de Pessoa Física informações relativas a doações efetuadas em favor da autora, o que levou ao Fisco Estadual a identificar a ocorrência de fato gerador de ITCMD, e, posteriormente, à propositura de ação fiscal.  4. Não há prova da ilicitude da conduta do réu, porque a autora deixou de demonstrar que os bens em questão não foram recebidos mediante doação, e sim pela partilha decorrente do divórcio com o requerido, integrando a sua meação sobre o patrimônio comum do casal. 5. O instrumento particular de partilha é nulo, porque produzido em desacordo com a forma legal, de modo que não corrobora a tese da requerente. 6. Também não se verifica nexo de causalidade entre a conduta reputada como ilícita e o dano, cuja causa eficiente foi fato atribuído à vítima, que não empreendeu mínimos esforços para afastar a exigibilidade do crédito tributário.  7. A autora deixou de apresentar defesa na fase administrativa, e, durante a execução fiscal, opôs exceção de pré-executividade, rejeitada porque a matéria exigiria a produção de prova acerca da não incidência do ITCMD .  8. A conduta da autora revela violação à boa-fé objetiva, especialmente no tocante ao princípio do duty to mitigate the loss, que impõe à parte lesada o dever de adotar medidas razoáveis para evitar a ocorrência ou agravamento do dano.  IV. DISPOSITIVO E TESE 9. Recurso desprovido. ________ Dispositivos relevantes citados: CC, art. 104, III, 186 e 927; CPC/73 art. 1.124-A. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no AgInt nos EDcl no AREsp n. 2.372.141/PE, rel. Min. Francisco Falcão, Segunda Turma, j. 07.10.2024. ACÓRDÃO Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Câmara de Direito Civil do decidiu, por unanimidade, conhecer e negar provimento ao recurso de apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. Florianópolis, 11 de novembro de 2025. assinado por EDUARDO MATTOS GALLO JUNIOR, Desembargador, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 6904605v6 e do código CRC 4501bf36. Informações adicionais da assinatura: Signatário (a): EDUARDO MATTOS GALLO JUNIOR Data e Hora: 12/11/2025, às 10:52:25     5029807-80.2024.8.24.0038 6904605 .V6 Conferência de autenticidade emitida em 16/11/2025 16:27:51. Identificações de pessoas físicas foram ocultadas Extrato de Ata EXTRATO DE ATA DA SESSÃO ORDINÁRIA FÍSICA DE 11/11/2025 Apelação Nº 5029807-80.2024.8.24.0038/SC RELATOR: Desembargador EDUARDO GALLO JR. PRESIDENTE: Desembargador EDUARDO GALLO JR. PROCURADOR(A): ANTENOR CHINATO RIBEIRO Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Ordinária Física do dia 11/11/2025, na sequência 20, disponibilizada no DJe de 27/10/2025. Certifico que a 6ª Câmara de Direito Civil, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão: A 6ª CÂMARA DE DIREITO CIVIL DECIDIU, POR UNANIMIDADE, CONHECER E NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO DE APELAÇÃO APÓS A LEITURA DO VOTO, A ADVOGADA LETÍCIA KLECHOWICZ DECLINOU DO PEDIDO DE SUSTENTAÇÃO ORAL. RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador EDUARDO GALLO JR. Votante: Desembargador EDUARDO GALLO JR. Votante: Desembargador MARCOS FEY PROBST Votante: Desembargador JOAO DE NADAL NEUZELY SIMONE DA SILVA Secretária Conferência de autenticidade emitida em 16/11/2025 16:27:51. Identificações de pessoas físicas foram ocultadas