Órgão julgador: Turma, DJe de 14.09.2022 - grifei).
Data do julgamento: 19 de dezembro de 2006
Ementa
RECURSO – Documento:7064710 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA RECURSO ESPECIAL EM Agravo de Instrumento Nº 5032959-22.2025.8.24.0000/SC DESPACHO/DECISÃO Estado de Santa Catarina interpôs recurso especial com fundamento no art. 105, III, "a", da Constituição Federal (evento 32, RECESPEC1). O recurso especial visa reformar o acórdão do evento 24, ACOR2. Quanto à controvérsia, pela alínea "a" do permissivo constitucional, a parte recorrente alega violação ao art. 104 do Código de Defesa do Consumidor no que concerne ao ajuizamento de ação individual posterior à coletiva, defendendo que a renúncia tácita independe de notificação ou prova. Afirma:
(TJSC; Processo nº 5032959-22.2025.8.24.0000; Recurso: RECURSO; Relator: ; Órgão julgador: Turma, DJe de 14.09.2022 - grifei). ; Data do Julgamento: 19 de dezembro de 2006)
Texto completo da decisão
Documento:7064710 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA
RECURSO ESPECIAL EM Agravo de Instrumento Nº 5032959-22.2025.8.24.0000/SC
DESPACHO/DECISÃO
Estado de Santa Catarina interpôs recurso especial com fundamento no art. 105, III, "a", da Constituição Federal (evento 32, RECESPEC1).
O recurso especial visa reformar o acórdão do evento 24, ACOR2.
Quanto à controvérsia, pela alínea "a" do permissivo constitucional, a parte recorrente alega violação ao art. 104 do Código de Defesa do Consumidor no que concerne ao ajuizamento de ação individual posterior à coletiva, defendendo que a renúncia tácita independe de notificação ou prova. Afirma:
Com o devido respeito, o v. acórdão recorrido partiu de premissa equivocada ao condicionar o reconhecimento da renúncia tácita à "prova inequívoca de ciência da parte". A jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça é pacífica e uníssona no sentido de que a sistemática do art. 104 do CDC que prevê a necessidade de o autor da ação individual ser cientificado para requerer a suspensão do seu processo aplica-se exclusivamente quando a ação individual é anterior à coletiva.
[...]
Quando a situação é inversa, como no caso dos autos onde a Ação Coletiva nº 0326927-27.2014.8.24.0023 foi ajuizada em 25/08/2014 e as ações individuais foram propostas posteriormente , a escolha do indivíduo por litigar autonomamente, buscando o mesmo bem da vida já pleiteado coletivamente, representa uma opção clara e inequívoca pela via individual em detrimento da tutela coletiva.
Tal conduta constitui a própria renúncia tácita, sendo descabido exigir que o réu (o Estado) comprove que o autor tinha "ciência inequívoca" da demanda coletiva. A opção pela demanda individual posterior é o ato que, por si só, materializa a renúncia.
[...]
A decisão recorrida, portanto, ao criar um requisito não previsto em lei para a hipótese e ao ignorar a sedimentada jurisprudência desta Corte, afrontou diretamente o art. 104 do CDC, conferindo-lhe uma interpretação extensiva e contrária à sua finalidade.
[...]
Permitir que o jurisdicionado, após exercer sua opção pela via individual, venha posteriormente a se beneficiar da sentença coletiva à qual tacitamente renunciou, configura um comportamento contraditório, vedado pelo princípio da boa-fé processual (venire contra factum proprium).
A parte não pode se valer de duas vias processuais para a mesma pretensão, escolhendo, ao final, aquela que lhe for mais conveniente. Ao ajuizar sua própria demanda, o indivíduo manifesta seu desinteresse pelo resultado da ação coletiva, atraindo para si os bônus e, principalmente, os ônus de sua escolha processual.
[...]
Foi cumprido o procedimento do caput do art. 1.030 do Código de Processo Civil.
É o relatório.
Passo ao juízo preliminar de admissibilidade do recurso.
Quanto à controvérsia com relação ao art. 104 do Código de Defesa do Consumidor, o Colegiado de origem, ao negar provimento ao agravo de instrumento manejado pelo ente federado, concluiu que, apesar de as ações individuais terem sido ajuizadas após a ação coletiva, não restou demonstrado que a parte recorrida - exequente - tinha ciência inequívoca sobre a tramitação da ação coletiva quando do ajuizamento da ação individual.
Por esclarecedora, convém reproduzir a ementa do acórdão recorrido:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. CUMPRIMENTO INDIVIDUAL DE SENTENÇA COLETIVA. ALEGAÇÃO DE ILEGITIMIDADE ATIVA DE EXEQUENTES QUE AJUIZARAM AÇÕES INDIVIDUAIS EM DETRIMENTO DA EXISTÊNCIA DE AÇÃO COLETIVA. PRETENSÃO DE RECONHECIMENTO DE RENÚNCIA TÁCITA AOS EFEITOS DA COISA JULGADA COLETIVA. INAPLICABILIDADE DO ART. 104 DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. NECESSIDADE DE PROVA INEQUÍVOCA DA CIÊNCIA DOS SUBSTITUÍDOS ACERCA DA EXISTÊNCIA DA DEMANDA COLETIVA. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS COMPROBATÓRIOS. IMPOSSIBILIDADE DE PRESUNÇÃO DE CONHECIMENTO. PRECEDENTES. CUMULAÇÃO DE EXECUÇÕES ADMITIDA, COM ABATIMENTO DOS VALORES JÁ ADIMPLIDOS NAS DEMANDAS INDIVIDUAIS. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.
Consoante a jurisprudência consolidada desta Corte de Justiça, "é necessário que o litigante individual tenha ciência da propositura da ação coletiva para que os efeitos da coisa julgada daquela impeçam o aproveitamento dos efeitos da sentença na ação coletiva. [...] Além disso (e aqui este fator é muito importante), para que tal impedimento tenha efeito, é ônus do réu na ação coletiva cientificar os litigantes nas lides individuais a respeito do trâmite da ação coletiva, de modo que possam realizar a opção pela suspensão ou não. [...] Na hipótese, como sequer há demonstração de que o demandante na lide individual foi cientificado do curso da ação coletiva, a fim de requerer a suspensão na forma do art. 104 da Lei Federal n. 8.078/90, não poderia ele ser impedido do aproveitamento de seus efeitos. [...] Ora, alguém não pode renunciar tacitamente sobre algo a respeito do que não tinha sequer conhecimento; a conclusão não guarda em si lógica. [...] E quanto à distinção proposta pelo agravante quanto ao momento da propositura das ações individual e coletiva, verifica-se que ela não se sobrepõe ao fator - mais específico - que impõe a necessária ciência do autor na lide individual" (TJSC, Agravo de Instrumento n. 5021201-46.2025.8.24.0000, rel. Desembargador Vilson Fontana, Quinta Câmara de Direito Público, j. 20/5/2025).
E, ao assim decidir, verifico que o Órgão Julgador não destoou da jurisprudência firmada pelo Superior Tribunal de Justiça, a saber:
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO COLETIVA. CONCOMITÂNCIA COM AÇÃO INDIVIDUAL. INTERPRETAÇÃO DO ART. 104 DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR.
1. Segundo a jurisprudência do STJ, a regra prevista no art. 104 do CDC, somente se aplica nos casos de propositura da ação coletiva após o ajuizamento de ações individuais, hipótese diversa da situação dos autos, em que a ação coletiva foi proposta antes da ação individual. Precedentes.
2. Incide, nesse aspecto, como óbice ao recurso especial, a Súmula 83 do STJ.
3. Agravo interno desprovido (AgInt no AgInt no REsp 2102724/AL, rel. Min. Gurgel de Faria, j. em 24.02.2025).
E:
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO DE AÇÃO COLETIVA. RENÚNCIA TÁCITA. ILEGITIMIDADE ATIVA. AGRAVO PROVIDO. DESPROVIMENTO DO AGRAVO INTERNO. MANUTENÇÃO DA DECISÃO RECORRIDA. NÃO OFENSA AO ART. 1.022 DO CPC/2015. INCIDÊNCIA DA SÚMULA N. 7/STJ E DA SÚMULA N. 83/STJ. (...) IV - A decisão está em sintonia com o entendimento firmado no Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que as regras do art. 104 do CDC incidem apenas quando a propositura da ação coletiva se dá posteriormente à da ação individual, o que configura hipótese diversa da situação dos autos. Dessa forma, aplica-se, à espécie, o enunciado da Súmula n. 83/STJ: 'Não se conhece do recurso especial pela divergência, quando a orientação do Tribunal se firmou no mesmo sentido da decisão recorrida.' Ressalte-se que o teor do referido enunciado aplica-se, inclusive, aos recursos especiais interpostos com fundamento na alínea a do permissivo constitucional. V - Agravo interno improvido" (AgInt no AREsp 1.980.851/RS, Rel. Min. Francisco Falcão, Segunda Turma, DJe de 14.09.2022 - grifei).
Dessarte, tendo em vista que a decisão hostilizada perfilhou tese congruente com a jurisprudência do STJ, o presente Recurso Especial não merece ser admitido em razão do óbice trazido pela Súmula 83 do STJ, in verbis: "Não se conhece do recurso especial pela divergência, quando a orientação do Tribunal se firmou no mesmo sentido da decisão recorrida".
A par disso, quanto à controvérsia, no que pertine à ausência de prova da ciência inequívoca da parte recorrida sobre a existência de ação coletiva antecedente, a ascensão do reclamo esbarra na Súmula 7 do STJ, pois verifico que a análise das razões recursais, tais como postas, e a reversão da conclusão alcançada pelo acórdão recorrido demandariam reexame do contexto fático-probatório, e não sua mera revaloração, providência inviável em sede de recurso especial, nos termos do referido enunciado sumular ("A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial").
A propósito, por amostragem, colho da jurisprudência da Corte Superior:
PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO COLETIVA. COISA JULGADA. EXTENSÃO DOS EFEITOS PARA DEMANDA INDIVIDUAL. REQUERIMENTO DE SUSPENSÃO. CIÊNCIA INEQUÍVOCA. PROVA. AUSÊNCIA. SÚMULAS 7 E 211 DO STJ. INCIDÊNCIA.
[...]
2. O sistema processual brasileiro admite a coexistência de ação coletiva e ação individual que postulem o reconhecimento de um mesmo direito, inexistindo litispendência entre as demandas.
3. Nos termos do art. 104 do Código de Defesa do Consumidor, aquele que ajuizou ação individual pode aproveitar de eventuais benefícios resultantes da coisa julgada a ser formada na demanda coletiva, desde que postule a suspensão daquela, no prazo de 30 (trinta) dias contados da ciência da ação coletiva, até o julgamento do litígio de massa, podendo ser retomada a tal tramitação no caso de a sentença coletiva ser pela improcedência do pedido, ou ser (o feito individual) julgado extinto, sem resolução de mérito, por perda de interesse (utilidade), se o decisum coletivo for pela procedência do pleito (AgInt na PET nos EREsp 1405424/SC, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 26/10/2016, DJe 29/11/2016).
4. Hipótese em que o Tribunal de origem admitiu que os efeitos da decisão proferida na ação coletiva "fossem estendidos a todos os substituídos, independentemente de haver outros processos individuais referentes ao mesmo tema", sem, no entanto, ter sido provocado a afirmar se houve inequívoca ciência dos autores das demandas individuais acerca da demanda coletiva.
5. A simples oposição dos embargos de declaração, visando à manifestação da Corte sobre o teor do art. 104 do CDC, não supre o requisito do prequestionamento quando não há o debate do tema controvertido, consoante a inteligência da Súmula 211 do STJ.
Precedentes.
6. À mingua de prova de que houve a ciência nos autos da ação individual, não há como afastar a extensão dos eventuais efeitos erga omnes decorrentes da coisa julgada na ação coletiva.
7. Reformar o julgado - para determinar a exclusão dos efeitos da coisa julgada coletiva para aqueles que possuem ações individuais contra o Estado/agravante e que, mesmo cientes do trâmite da presente ação, optaram por prosseguir com as suas demandas (individuais) - sem, no entanto, saber se tal fato (ciência) ocorreu, já que silente a respeito o acórdão do Tribunal a quo recorrido, reclama análise de matéria fático-probatória, pois, para tanto, é mister constatar a formulação de pedido suspensivo pelos autores da demanda individual, providência sabidamente vedada na via especial, nos termos da Súmula 7 do STJ.
8. Agravo interno desprovido (AgInt no AREsp 691504/AL, rel. Min. Gurgel de Faria, j. em 02.12.2019 - grifei).
Consabido que o Superior Tribunal de Justiça, em determinadas situações, vem distinguindo em diferentes planos as figuras do "mero reexame das provas", não admitindo o recurso especial; e da "revaloração da prova", admitindo e analisando as questões trazidas no bojo do apelo nobre.
A propósito:
"[...] sabe-se que o reexame do conjunto fático-probatório não se confunde com a "valoração dos critérios jurídicos respeitantes à utilização da prova e à formação da convicção". O que o enunciado n. 7 da Súmula do STJ visa impedir é a formulação de nova convicção acerca dos fatos, a partir das provas. Por isso, esse entendimento sumulado apenas pode ser afastado nas hipóteses em que o recurso especial veicula questões eminentemente jurídicas, atinentes ao direito probatório" (STJ, AgRg no AREsp 723.035/DF, Relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, j. em 17.11.2015).
Contudo, esse não é o caso dos autos, uma vez que a alteração do entendimento firmado pelo Colegiado de origem exigiria a reapreciação do conjunto de provas e de fatos, providência esta incompatível com a estreita via do recurso especial.
Em arremate:
PROCESSUAL CIVIL. [...]. REANÁLISE. INCIDÊNCIA DA SÚMULA N. 7/STJ. [...] III - A Corte de origem analisou a controvérsia principal dos autos levando em consideração os fatos e provas relacionados à matéria.
Assim, para se chegar à conclusão diversa, seria necessário o reexame fático-probatório, o que é vedado pelo enunciado n. 7 da Súmula do STJ, segundo o qual "A pretensão de simples reexame de provas não enseja recurso especial". [...] VIII - Agravo interno improvido".
(AgInt no REsp n. 2.094.670/TO, relator Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 18/12/2023, DJe de 20/12/2023).
Assim, a insurgência transborda as funções da Corte Superior, qual seja, a de primar pela correta interpretação do direito federal infraconstitucional e uniformizar a jurisprudência pátria.
Ante o exposto, com fundamento no art. 1.030, V, do Código de Processo Civil, NÃO ADMITO o recurso especial do evento 32, RECESPEC1.
Anoto que, contra a decisão que não admite recurso especial, o único recurso cabível é o agravo em recurso especial, previsto no art. 1.042 do Código de Processo Civil (e não o agravo interno previsto no art. 1.021 c/c 1.030, § 2º, do Código de Processo Civil). Ademais, registro que, conforme entendimento pacífico das Cortes Superiores, a oposição de embargos de declaração contra a decisão de Vice-Presidente do Tribunal de origem que realiza o juízo de admissibilidade de recurso especial ou extraordinário não suspende ou interrompe o prazo para a interposição do agravo cabível na hipótese.
Intimem-se.
assinado por JÚLIO CÉSAR MACHADO FERREIRA DE MELO, 2° Vice-Presidente, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7064710v2 e do código CRC aad58025.
Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): JÚLIO CÉSAR MACHADO FERREIRA DE MELO
Data e Hora: 11/11/2025, às 13:09:47
5032959-22.2025.8.24.0000 7064710 .V2
Conferência de autenticidade emitida em 16/11/2025 16:40:35.
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