Decisão TJSC

Processo: 5073193-46.2025.8.24.0000

Recurso: Agravo

Relator:

Órgão julgador:

Data do julgamento: 19 de dezembro de 2006

Ementa

AGRAVO – Documento:7053764 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA Agravo de Instrumento Nº 5073193-46.2025.8.24.0000/SC DESPACHO/DECISÃO 1. O MPSC ajuizou ação civil pública contra a Companhia Catarinense de Águas e Saneamento (CASAN)e o Município de Urubici, alegando que a comunidade de Águas Brancas recebe, desde 2023, água imprópria ao consumo, com graves riscos à saúde. Requereu, em liminar e no mérito, a adequação da qualidade do serviço, a limitação da cobrança à tarifa mínima e o fornecimento emergencial de caminhões-pipa. Reconhecendo a plausibilidade do direito invocado, o risco de dano à saúde coletiva e a essencialidade do bem jurídico em questão, o magistrado de origem deferiu parcialmente a tutela provisória de urgência. Determinou à CASAN e ao Município que, no prazo de 90 dias, comprovem a adequação da água aos parâmetros legais de potabilidade, sob pena de multa diária; impô...

(TJSC; Processo nº 5073193-46.2025.8.24.0000; Recurso: Agravo; Relator: ; Órgão julgador: ; Data do Julgamento: 19 de dezembro de 2006)

Texto completo da decisão

Documento:7053764 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA Agravo de Instrumento Nº 5073193-46.2025.8.24.0000/SC DESPACHO/DECISÃO 1. O MPSC ajuizou ação civil pública contra a Companhia Catarinense de Águas e Saneamento (CASAN)e o Município de Urubici, alegando que a comunidade de Águas Brancas recebe, desde 2023, água imprópria ao consumo, com graves riscos à saúde. Requereu, em liminar e no mérito, a adequação da qualidade do serviço, a limitação da cobrança à tarifa mínima e o fornecimento emergencial de caminhões-pipa. Reconhecendo a plausibilidade do direito invocado, o risco de dano à saúde coletiva e a essencialidade do bem jurídico em questão, o magistrado de origem deferiu parcialmente a tutela provisória de urgência. Determinou à CASAN e ao Município que, no prazo de 90 dias, comprovem a adequação da água aos parâmetros legais de potabilidade, sob pena de multa diária; impôs à CASAN a cobrança apenas da tarifa mínima até a regularização do serviço, também sob sanção pecuniária; e ordenou ao Município que, em 30 dias, providencie caminhões-pipa para o abastecimento emergencial da comunidade. Contra essa decisão a CASAN interpôs o presente agravo de instrumento, alegando, em suma, que: (I) relatórios técnicos recentes e medidas estruturais já implementadas no sistema atestam a conformidade da água com os parâmetros legais, de modo que não há fundamento para medida tão gravosa; (II) laudos elaborados por laboratório acreditado pelo Inmetro comprovam a potabilidade da água, sendo eventuais desconformidades pontuais e corrigidas de imediato, em consonância com a legislação que impõe avaliação histórica do controle; (III) a restrição tarifária compromete o equilíbrio econômico-financeiro do contrato de concessão, em afronta ao artigo 22, IV, da Lei n. 11.445/2007 e ao artigo 13 da Lei n. 8.987/1995, além de incentivar desperdício e inviabilizar investimentos; (IV) a decisão desconsidera a presunção de legitimidade dos atos praticados pela concessionária, reconhecida como Fazenda Pública; e (V) há risco de periculum in mora inverso, pois a impossibilidade de cobrança regular ameaça a sustentabilidade do serviço essencial. Postulou, liminarmente, a suspensão da decisão agravada e, ao final, o provimento do recurso para restabelecer a cobrança pelo consumo efetivo. Pela decisão do evento 14, deferi parcialmente a tutela recursal para suspender a eficácia da decisão agravada no que impôs à agravante a limitação da cobrança à tarifa mínima. Apesar de regularmente intimada, a parte agravada não apresentou contrarrazões. Com vista dos autos, a Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer subscrito pelo Dr. Marcelo Wegner, opinou pelo provimento parcial do recurso "exclusivamente para afastar a restrição tarifária imposta na origem, substituindo-se da tutela antecipada, para determinar que a Agravante se abstenha de suspender o fornecimento do serviço aos consumidores cuja inadimplência decorrer de faturas emitidas no período compreendido entre junho de 2023 até a data em que se comprovar o atendimento aos parâmetros sanitários" (ev. 28). Vieram os autos. 3. Dou parcial provimento ao recurso, nos termos e limites da fundamentação exposta na decisão que concedeu a tutela recursal, in verbis: Os relatórios apresentados pela CASAN (ev. 18, anexos 3 e 4, 1G), referentes ao período de novembro de 2023 a julho de 2025, indicam conformidade dos aspectos microbiológicos da água distribuída à comunidade de Águas Brancas, sugerindo que as falhas inicialmente apontadas foram sanadas. Porém, não enfrentam de modo específico e claro os aspectos sensoriais da água (cor, odor, sabor e turbidez), que constituem justamente o núcleo das reclamações que motivaram a ação civil pública. Tais atributos (denominados parâmetros organolépticos) são perceptíveis a olho nu ou por meio dos sentidos, e sua inadequação não implica, necessariamente, risco sanitário direto, mas compromete a aceitação pública do serviço e afeta a dignidade do abastecimento. É verdade que os relatórios gozam de presunção de veracidade, por se tratarem de documentos subscritos pela própria concessionária. Contudo, ao deixarem de mencionar expressamente os parâmetros organolépticos, ou ao abordá-los de maneira genérica, sem detalhar os índices efetivamente apurados ou os procedimentos adotados para monitorá-los, mantêm-se dúvidas razoáveis sobre a superação da totalidade dos problemas relatados na exordial. Essa lacuna probatória, somada ao fato de que os documentos foram juntados apenas após a decisão agravada e ainda não foram apreciados pelo juízo de origem, reforça o acerto da tutela provisória que impôs aos réus o dever de demonstrar a adequação da água aos parâmetros legais de potabilidade, sob pena de multa diária. A matéria, neste ponto, permanece controvertida, e o exame exauriente demandará instrução probatória, o que desautoriza a sua revogação neste momento processual. Superado esse ponto, passa-se à análise da segunda parcela da decisão agravada, atinente à imposição da tarifa mínima. A fundamentação da decisão agravada, nesse ponto, revela-se precária, já que amparada exclusivamente na suposição de que a deficiência do serviço teria provocado aumento no consumo dos usuários, sem que haja qualquer base empírica que sustente tal correlação. Não se demonstrou, por exemplo, que a qualidade da água tenha efetivamente gerado elevação anormal do consumo, tampouco se apurou se os volumes faturados guardam ou não proporcionalidade com o padrão histórico de utilização domiciliar. A medida imposta carece, portanto, de substrato técnico e lógico que legitime sua adoção em sede liminar, notadamente quando confrontada com os efeitos que produz. Com efeito, a imposição de tarifa mínima, desatrelada de critério objetivo de consumo, revela-se apta a produzir distorções no equilíbrio econômico-financeiro do contrato de concessão, especialmente se mantida por prazo indeterminado e sem compensação futura. Tal desequilíbrio apresenta potencialidade concreta para comprometer a sustentabilidade econômica do serviço público prestado na região e, por consequência, a capacidade de investimento da própria concessionária na superação das deficiências operacionais apontadas. Há, nesse contexto, perigo de dano inverso, caracterizado pela possibilidade de que a manutenção da restrição tarifária, embora voltada à proteção do consumidor, resulte em prejuízos mais graves à coletividade e ao resultado útil do processo. Soma-se a isso a constatação de que a fixação de tarifa mínima pode, paradoxalmente, estimular o desperdício de água, uma vez que desincentiva o uso consciente e proporcional ao consumo real, em afronta ao princípio da modicidade e à diretriz constitucional da eficiência na prestação dos serviços públicos. Trata-se, em última análise, de medida que, embora aparentemente protetiva, pode resultar em prejuízos mais amplos ao próprio interesse coletivo. Diante desse quadro, e sem prejuízo da reavaliação global da matéria por ocasião do julgamento de mérito, mostra-se juridicamente adequada a concessão da tutela recursal, exclusivamente para suspender os efeitos da decisão agravada no ponto em que restringe a cobrança ao valor da tarifa mínima. Permanecem válidos os fundamentos já expostos quanto à primeira parte da decisão agravada, mantida no ponto em que impôs à concessionária o dever de comprovar a adequação da água aos parâmetros legais de potabilidade. Os relatórios apresentados indicam regularidade microbiológica, mas não esclarecem os parâmetros organolépticos (cor, odor, sabor e turbidez), essenciais à controvérsia. Essa lacuna impede reconhecer a plena normalidade do serviço e justifica a manutenção da obrigação de comprovação. Quanto à segunda parte da decisão, que limitou a cobrança à tarifa mínima, verifica-se ausência de base técnica e jurídica. O fundamento adotado na origem (presunção de aumento de consumo em razão da má qualidade da água) carece de prova e desconsidera o princípio da proporcionalidade na fixação de tarifas públicas. A medida, além de comprometer o equilíbrio econômico-financeiro do contrato de concessão, afronta os artigos 6º, §1º, e 9º, §2º, da Lei n. 8.987/1995, com risco de prejuízo à coletividade e de dano inverso.  Finalmente, o parecer do Ministério Público propõe a substituição da limitação tarifária imposta na decisão agravada por medida diversa, consistente em vedar a suspensão do fornecimento de água às unidades consumidoras durante o período de controvérsia, quando a inadimplência decorrer de faturas emitidas no intervalo em que a água se mostrou potencialmente imprópria para consumo. Afirma que essa providência seria mais adequada às diretrizes do artigo 29, §1º, da Lei n. 11.445/2007, por manter a vinculação entre tarifa e consumo efetivo, e que, ao mesmo tempo, evitaria o endividamento dos consumidores caso a ação fosse julgada improcedente. A proposta, todavia, não se sustenta sob exame mais detido. Em primeiro lugar, a substituição da medida liminar para impor restrição ainda mais onerosa à concessionária caracteriza evidente reformatio in pejus, vedada no âmbito recursal, uma vez que o recurso foi interposto pela própria agravante, buscando restringir a tutela antecipada. A adoção de solução mais gravosa, portanto, extrapola os limites da devolutividade e contraria o princípio da congruência decisória, porque amplia o ônus econômico imposto à recorrente, que deixaria de receber qualquer contraprestação pelo serviço prestado durante o período litigioso, sendo obrigada a manter o fornecimento de água mesmo diante de inadimplência total dos consumidores. Em segundo lugar, o próprio raciocínio desenvolvido pelo Ministério Público conduz à conclusão oposta à pretendida. Se o temor é o endividamento futuro dos consumidores em caso de improcedência da demanda, tal risco se intensifica com a substituição proposta: na hipótese de suspensão da cobrança durante todo o período litigioso, os usuários se tornariam devedores não apenas da diferença entre o valor mínimo e o efetivo consumo, mas da integralidade das faturas inadimplidas, acrescida de correção e encargos. A medida, portanto, amplia o risco de endividamento coletivo, especialmente em comunidades de reconhecida vulnerabilidade econômica. Além disso, já existe tutela de urgência específica (e mantida por esta decisão) assegurando o abastecimento da região por meio de caminhões-pipa, o que neutraliza o risco de descontinuidade do serviço e torna desnecessária a vedação generalizada de corte. Essa solução já garante o fornecimento mínimo essencial, sem comprometer a sustentabilidade econômica da concessão nem incentivar o inadimplemento generalizado. Por fim, não há risco de desamparo ao consumidor. Caso, ao final do processo, se reconheça judicialmente que a água fornecida em determinado período era inadequada para o consumo, os usuários poderão buscar da CASAN a restituição ou compensação cabível, mediante liquidação e cumprimento de sentença. Assim, a proteção de eventual direito material pode ser plenamente assegurada ao término da instrução, sem necessidade de criar, no curso do processo, distorções tarifárias ou desequilíbrios contratuais. 4. Isso posto, provejo parcialmente o recurso, nos termos da fundamentação. Intimem-se. Transitada em julgado, dê-se baixa. assinado por MARIA DO ROCIO LUZ SANTA RITTA, Desembargadora Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7053764v9 e do código CRC 349b0fbf. Informações adicionais da assinatura: Signatário (a): MARIA DO ROCIO LUZ SANTA RITTA Data e Hora: 10/11/2025, às 18:42:51     5073193-46.2025.8.24.0000 7053764 .V9 Conferência de autenticidade emitida em 18/11/2025 02:22:29. Identificações de pessoas físicas foram ocultadas