Decisão TJSC

Processo: 5091387-54.2024.8.24.0930

Recurso: conflito

Relator:

Órgão julgador: Turma, unânime, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, j. em 21.2.2022).

Data do julgamento: 19 de dezembro de 2006

Ementa

CONFLITO – Documento:7072278 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA Apelação Nº 5091387-54.2024.8.24.0930/SC DESPACHO/DECISÃO C. C. K. G. interpôs APELAÇÃO contra a sentença proferida nos autos da ação revisional, que tramitou no Juízo de Direito da Unidade Estadual de Direito Bancário, na qual foi julgado procedente, em parte, o intento autoral, com a ordem para redução dos juros remuneratórios à média de mercado, acrescida de 50%, bem como a condenação do réu na repetição simples do que foi pago em excesso.   Bradou a recorrente que os juros remuneratórios devem ser reduzidos à média de mercado, sem acréscimo, e que deve ser empregado o IGP-M como índice de correção monetária. Por fim, pleiteou a descaracterização da mora e a fixação de honorários advocatícios por apreciação equitativa.

(TJSC; Processo nº 5091387-54.2024.8.24.0930; Recurso: conflito; Relator: ; Órgão julgador: Turma, unânime, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, j. em 21.2.2022).; Data do Julgamento: 19 de dezembro de 2006)

Texto completo da decisão

Documento:7072278 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA Apelação Nº 5091387-54.2024.8.24.0930/SC DESPACHO/DECISÃO C. C. K. G. interpôs APELAÇÃO contra a sentença proferida nos autos da ação revisional, que tramitou no Juízo de Direito da Unidade Estadual de Direito Bancário, na qual foi julgado procedente, em parte, o intento autoral, com a ordem para redução dos juros remuneratórios à média de mercado, acrescida de 50%, bem como a condenação do réu na repetição simples do que foi pago em excesso.   Bradou a recorrente que os juros remuneratórios devem ser reduzidos à média de mercado, sem acréscimo, e que deve ser empregado o IGP-M como índice de correção monetária. Por fim, pleiteou a descaracterização da mora e a fixação de honorários advocatícios por apreciação equitativa.  Na sequência, BANCO AGIBANK S/A interpôs APELAÇÃO aventando, em preliminar, a falta de interesse de agir porque a autora não buscou, na via administrativa, a solução do conflito. Incursionando no mérito, defendeu que a taxa média de mercado divulgada pelo Banco Central do Brasil não pode ser utilizada como único parâmetro para aferição de abusividades. Por isso, com apego no brocardo jurídico pacta sunt servanda, asseverou que os juros remuneratórios não comportam revisão porque, além de terem sido expressamente aceitos, não revelam abusividade diante do perfil de alto risco da contratante. Requereu, caso venha a ser confirmada a alteração das taxas de juros previstas nos contratos, que o índice não seja inferior a 1,5 vezes a média de mercado. Por fim, alegou que não cabe a devolução do que já foi pago e que deve ser empregado o IGP-M como índice de correção monetária.   Após apresentadas as contrarrazões, os autos ascenderam a esta Corte de Justiça.   1. A comprovação de que o autor buscou, na via administrativa, informações sobre o contrato posto em revisão não constitui pressuposto para o ajuizamento de ação revisional. Logo, a falta de prévio requerimento administrativo não obsta o acesso à justiça consagrado no inciso XXXV do artigo 5º da Constituição Federal (veja-se, a respeito: TJSC – Apelação nº 5056018-67.2022.8.24.0930, da Unidade Estadual de Direito Bancário, Quinta Câmara de Direito Comercial, unânime, rel. Des. Rocha Cardoso, j. em 23.11.2023).   Objetivamente, porque prescindível o questionamento administrativo do contrato para demonstrar-se o interesse de agir na postulação de revisão contratual, cai por terra a invocada ausência de pressuposto processual.   2. Pelo princípio da autonomia da vontade, os capazes podem contratar sem amarras. Entretanto, tal princípio não é aplicável indistintamente, de modo que deve-se atentar para os limites da ordem pública e da função social do contrato (CC, art. 421). De igual modo, o pacta sunt servanda, mandamento jurídico que preconiza que o acordo de vontades faz lei entre as partes, também deve ser flexibilizado a fim de inibir-se a estipulação de cláusulas que porventura desequilibrem a relação contratual, pondo o consumidor em desvantagem exagerada (CDC, art. 51, inc. IV) ou, ainda, que tornem a obrigação excessivamente onerosa para o contratante (CDC, art. 51, § 1º, inc. III) (nesse sentido: TJSP – Apelação Cível nº 1002044-39.2022.8.26.0572, de São Joaquim da Barras, Trigésima Sétima Câmara de Direito Privado, unânime, rel. Des. Sérgio Gomes, j. em 9.1.2023).        Essa linha de raciocínio ganha força na medida em que se notam disposições contratuais que vão de encontro a normas de ordem pública e de interesse social, como as previstas no Código de Defesa do Consumidor (CDC, art. 1º), as quais são inderrogáveis ainda que essa fosse a vontade dos interessados (José Geraldo Brito Filomeno, "Direitos do Consumidor", 15ª ed., São Paulo: Atlas, 2018, pág. 13).   Indo direto ao ponto, é possível, de forma excepcional, a revisão da taxa de juros remuneratórios posta em contratos de mútuo – sobre os quais incidirão as regras emanadas da legislação consumerista – desde que a abusividade fique cabalmente demonstrada, ou seja, quando o consumidor for posto em desvantagem exagerada (STJ – Agravo Interno no Recurso Especial nº 1.920.112/PR, Terceira Turma, unânime, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, j. em 21.2.2022).   C. C. K. G. entabulou contrato de empréstimo pessoal com Banco Agibank S/A e, acoimando de abusivos os juros remuneratórios estipulados, busca a revisão do pacto e a mitigação da respectiva taxa.   Sabe-se que "a estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade" (STJ – Súmula nº 382) e que a taxa média divulgada pelo Banco Central do Brasil representa mero referencial para a constatação de excessividades. É somente perante as particularidades iridescentes do caso concreto que a onerosidade do percentual compensatório poderá ser apurada. Para isso, levar-se-á em consideração circunstâncias, tais qual "o custo da captação dos recursos no local e época do contrato; o valor e o prazo do financiamento; as fontes de renda do cliente; as garantias ofertadas; a existência de prévio relacionamento do cliente com a instituição financeira; análise do perfil de risco de crédito do tomador; a forma de pagamento da operação, entre outros aspectos" (STJ – Recurso Especial nº 1.821.182/RS, Quarta Turma, unânime, relatora Ministra Maria Isabel Gallotti, j. em 29.6.2022).   Desvela-se do instrumento contratual sacramentado entre Carla e Agibank que os juros remuneratórios pactuados destoam significativamente da contemporânea média de mercado e, ainda que tenha tido oportunidade para fazê-lo, a instituição financeira não comprovou que a anabolização dos compensatórios foi pautada em concretas condições desfavoráveis para a concessão do crédito. Na verdade, a narrativa ventilada pela ré é genérica, abstrata, e, por isso, não tem o condão de justificar a incidência de taxas elevadas.   Eis a discrepância identificada:   ContratoDataJuros pactuadosMédia de mercadoSérie Bacen1239001375 (Evento 1, CONTR8)3.11.20229,07% a.m e 183,44% a.a5,32% a.m e 86,35% a.a25464 e 20742 - Crédito pessoal não consignado   Embora os juros remuneratórios tenham sido considerados excessivos pelo Juízo a quo, o intérprete deliberou pela aplicação de 150% da média divulgada pelo Banco Central, o que destoa do entendimento desta Câmara (TJSC – Apelação Cível nº 5026175-14.2021.8.24.0018, de Chapecó, Quinta Câmara de Direito Comercial, unânime, relatora Desembargadora Soraya Nunes Lins, j. em 30.3.2023), que encampou decisão do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que "os juros remuneratórios devem ser limitados à taxa média de mercado quando comprovada [...] a significativa discrepância entre a taxa pactuada e a taxa de mercado para operações similares [...]" (Agravo Interno no Agravo em Recurso Especial nº 1.823.166/RS, Quarta Turma, unânime, relator Ministro Marco Buzzi, j. em 21.2.2022).   Destarte, a sentença comporta reforma para que os juros remuneratórios sejam limitados à contemporânea taxa média de mercado divulgada pelo Banco Central do Brasil para operações análogas.   Ao arremate, "a procedência dos pedidos formulados em ação revisional de contrato bancário possibilita tanto a compensação de créditos quanto a devolução da quantia paga indevidamente, em obediência ao princípio que veda o enriquecimento ilícito" (STJ – Agravo Interno no Recurso Especial nº 1.679.635/PR, Quarta Turma, unânime, relator Ministro Antonio Carlos Ferreira, j. em 10.8.2020).   Em conformidade com o que foi ordenado na sentença recorrida, o montante a ser restituído à autora deverá ser atualizado pela variação do INPC/IBGE, a partir do desembolso, e acrescido de juros de mora, estes a fluir da citação, no percentual de 1% ao mês. A partir da vigência da Lei nº 14.905/2024, a atualização monetária deverá ser calculada pelo IPCA/IBGE e os juros de mora pela SELIC, deduzido o IPCA (CC, art. 406, §1º c/c art. 389, parágrafo único). Não tem espaço, portanto, a pretendida imposição do IGP-M como índice de atualização monetária.   3. Comprovada a abusividade de encargo cobrado no período da normalidade contratual, deve ser descaracterizada a mora do consumidor, conforme entendimento estabelecido no Tema 28 do Superior Tribunal de Justiça ["o reconhecimento da abusividade nos encargos exigidos no período da normalidade contratual (juros remuneratórios e capitalização) descaracteriza a mora"].    Ademais, dada a revogação da Súmula nº 66 deste Tribunal, o afastamento da mora prescinde do depósito do valor incontroverso da dívida.   4. Quanto aos honorários sucumbenciais, também tem razão a autora/recorrente. Porque o proveito econômico obtido foi irrisório pois resultante de revisão de taxas de juros remuneratórios de empréstimo de reduzido valor, o estipêndio do patrono da vencedora deve ser fixado por apreciação equitativa, na forma do artigo 85, §8º do Código de Processo Civil (veja-se, a respeito: TJSC – Apelação Cível nº 5015594-74.2021.8.24.0038, de Joinville, Quinta Câmara de Direito Comercial, unânime, relatora Desembargadora Soraya Nunes Lins, j. em 30.3.2023). Ponderando-se os critérios irradiados do §2º do referido dispositivo da lei processual, os honorários sucumbenciais devem ser fixados em R$ 1.500,00, a serem pagos pelo Banco Agibank S/A em prol do advogado de Carla.   5. Desprovido o recurso do réu, majoro em R$ 300,00 os honorários recursais (CPC, art. 85, § 11), os quais, somados aos R$ 1.500,00 já estipulados, totalizam R$ 1.800,00.    À luz do exposto, conheço dos recursos e, com fulcro no disposto no artigo 932, inciso VIII, do CPC c/c artigo 132, incisos XV e XVI, do RITJSC, nego provimento ao intento do Banco Agibank S/A e dou provimento à pretensão recursal de Carla para ordenar a descaracterização da mora, a redução dos juros remuneratórios à média de mercado, sem acréscimo, e fixar em R$ 1.500,00 os honorários sucumbenciais devidos ao patrono da autora, atualizados daqui para frente. assinado por ROBERTO LEPPER, Desembargador Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7072278v6 e do código CRC aec64a2d. Informações adicionais da assinatura: Signatário (a): ROBERTO LEPPER Data e Hora: 13/11/2025, às 19:54:25     5091387-54.2024.8.24.0930 7072278 .V6 Conferência de autenticidade emitida em 16/11/2025 15:46:50. Identificações de pessoas físicas foram ocultadas