EMBARGOS – Documento:6933612 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA Apelação Nº 5009072-51.2020.8.24.0075/SC RELATOR: Desembargador Substituto GIANCARLO BREMER NONES RELATÓRIO Para retratar o desenvolvimento processual, adota-se o relatório da sentença: TÁRTARI & ALMEIDA EMPREENDIMENTOS LTDA embargou a execução de título extrajudicial nº 5005721-70.2020.8.24.0075, que lhe move S. C. D. S.. Nos autos da execução, o exequente/embargado busca o cumprimento do contrato de compra e venda de cotas sociais e outras avenças celebrado entre as partes, especificamente para ver transferida para si a cota social adquirida na sociedade empresária COMPLEXO JUAREZ BITTENCOURT JÚNIOR, CNPJ 14.337.334/0001-60, correspondente ao apartamento 802 e à vaga de garagem nº 11 na Torre I, e para receber a multa estipulada na cláusula décima da avença, no percentual de 20% (vinte por cento) do valor do contrato.
(TJSC; Processo nº 5009072-51.2020.8.24.0075; Recurso: embargos; Relator: Desembargador Substituto GIANCARLO BREMER NONES; Órgão julgador: ; Data do Julgamento: 12 de novembro de 2025)
Texto completo da decisão
Documento:6933612 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Apelação Nº 5009072-51.2020.8.24.0075/SC
RELATOR: Desembargador Substituto GIANCARLO BREMER NONES
RELATÓRIO
Para retratar o desenvolvimento processual, adota-se o relatório da sentença:
TÁRTARI & ALMEIDA EMPREENDIMENTOS LTDA embargou a execução de título extrajudicial nº 5005721-70.2020.8.24.0075, que lhe move S. C. D. S..
Nos autos da execução, o exequente/embargado busca o cumprimento do contrato de compra e venda de cotas sociais e outras avenças celebrado entre as partes, especificamente para ver transferida para si a cota social adquirida na sociedade empresária COMPLEXO JUAREZ BITTENCOURT JÚNIOR, CNPJ 14.337.334/0001-60, correspondente ao apartamento 802 e à vaga de garagem nº 11 na Torre I, e para receber a multa estipulada na cláusula décima da avença, no percentual de 20% (vinte por cento) do valor do contrato.
A parte executada, então, opôs os presentes embargos, em que arguiu ausência de interesse processual e de obrigação líquida, certa e exigível, porquanto não se negou ao cumprimento do contrato. Sustentou que a transferência da cota depende de alteração do contrato social, que, por sua vez, depende de Os embargos foram recebidos sem efeito suspensivo (Evento 4).
Impugnação aos embargos no Evento 7.
Houve réplica (Evento 12).
Na decisão do Evento 19, foi designada audiência de conciliação, oportunidade em que, se não houvesse êxito, as partes deveriam especificar as provas a serem produzidas (Evento 19).
Não houve acordo e as partes pleitearam o julgamento antecipado do mérito (Evento 33). (evento 43, SENT1)
O juízo de origem acolheu o pedido e extinguiu o feito executivo, nos seguintes termos:
Ante o exposto, ACOLHO os presentes embargos à execução [...] e, por via consequência, JULGO EXTINTA a ação de execução nº 5005721-70.2020.8.24.0075, com fundamento no artigo 485, inciso IV, e artigo 783 do Código de Processo Civil.
Condeno a parte exequente/embargada ao pagamento das despesas processuais, dos embargos e da execução, e de honorários advocatícios em favor dos procuradores da parte adversa, os quais fixo em 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa, com fundamento no artigo 85, § 2º, do Código de Processo Civil. (evento 43, SENT1)
A embargada interpôs apelação, alegando que a transferência da cota social consiste na regularização da propriedade do apartamento e do box de garagem adquiridos, situação ainda não solucionada, o que motivou o ajuizamento da execução. Argumentou que a execução da obrigação de fazer está lastreada em título executivo hábil. Requereu o provimento do recurso para modificar a sentença e rejeitar os embargos à execução opostos, devendo o processo de execução prosseguir, inclusive quanto à multa contratual devida (evento 51, APELAÇÃO1).
Foram apresentadas contrarrazões (evento 57, CONTRAZAP1).
É o relatório.
VOTO
1. JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE
Estão presentes os pressupostos de admissibilidade: cabimento, legitimidade, interesse recursal, tempestividade e regularidade formal. O preparo foi devidamente recolhido.
2. JUÍZO DE MÉRITO
Trata-se de execução de obrigação de fazer cumulada com execução por quantia certa de cláusula penal, proposta por S. C. D. S. em face de Tartari & Almeida Empreendimentos Ltda, consubstanciada em contrato de compra e venda de cotas sociais e outras avenças, formalizado entre as partes em 15-6-2015 (evento 1, DOC4).
O contrato estabelece a compra, pelo apelante, e a venda, pela apelada, de 0,88%, representado por uma cota social da sociedade empresária Complexo Juarez Bittencourt Junior Construções Ltda (CNPJ n. 14.337.334/0001-60), correspondente ao apartamento n. 802 e um box de garagem n. 11, ambos situados na Torre I do edifício, ao valor de R$ 210.000,00.
É incontroverso que o apelante promoveu o pagamento total do contrato, a tempo e modo, conforme termo de quitação e demais recibos acostados à inicial de execução (evento 1, DOC7).
Da mesma forma, o apelante reconhece que lhe foram entregues as chaves do apartamento, momento em que tomou posse do bem.
A litigância, portanto, guarda razão com a regularização da propriedade do imóvel adquirido, situação não solucionada que originou a busca do apelante pelo A aquisição de bem imóvel por meio da compra de cotas sociais de empresa trata-se de procedimento cujo objeto é a transferência direta da qualidade de sócio da empresa proprietária do imóvel ao comprador, e não da propriedade do bem em si. A regularização da propriedade do imóvel ao comprador ocorre posteriormente, se essa for a vontade dos sócios.
Nesses casos, em regra, ocorre a regularização do Quadro de Sócios e Administradores em uma primeira etapa, momento em que os compradores das cotas passam a integrar a sociedade empresarial, por meio de instrumento de alteração contratual devidamente registrado no órgão competente (Junta Comercial). Posteriormente, realiza-se a regularização de propriedade dos bens, por meio de procedimento que desvincule a cota social do bem imóvel. Por fim, registra-se a escritura na matrícula individualizada do bem imóvel adquirido.
Tratando-se da aquisição de cotas de sociedade limitada (Complexo Juarez Bittencourt Junior Construções Ltda - CNPJ n. 14.337.334/0001-60), "a responsabilidade de cada sócio é restrita ao valor de suas quotas" (CC, art. 1.052).
As partes trouxeram subsídios limitados acerca do negócio jurídico realizado: não se tem notícia das matrículas correspondentes ao apartamento 802 e ao box 11, tampouco se já estão individualizadas e se de fato pertencem à propriedade da empresa cujas cotas foram revendidas.
Também não há cópia do contrato social da sociedade empresária que tem suas cotas vendidas, de forma que não há como saber se o direito ao uso do apartamento e box de garagem são exclusivos do comprador, ou seja, se as demais cotas não interferem no direito de posse do comprador junto aos imóveis e vice-versa.
Por fim, e o mais importante, o contrato não estabelece se haverá regularização da propriedade dos imóveis (apartamento e box) aos compradores posteriormente, ou se a pessoa jurídica permanecerá na condição de proprietária dos bens do empreendimento.
Assim, a análise deve ser limitada ao cumprimento da obrigação efetivamente avençada entre os litigantes, qual seja, a regularização de transferência da cota social adquirida pelo apelante, junto à pessoa jurídica Complexo Juarez Bittencourt Junior Construções Ltda - CNPJ n. 14.337.334/0001-60.
Segundo o art. 1.057 do Código Civil (CC), a aquisição das cotas exige averbação do instrumento de cessão no órgão competente (Junta Comercial) para que a cessão tenha eficácia perante os demais sócios e terceiros.
Sobre isso, em consulta ao sítio eletrônico da Receita Federal do Brasil, observa-se que o apelante não integra o Quadro de Sócios e Administradores da empresa, situação que demonstra ausência de regularização da cessão de cotas estabelecida nas cláusulas primeira e segunda do contrato.
Por outro lado, como devidamente comprovado pela apelada nos autos, o registro da alteração contratual na Junta Comercial depende da assinatura dos sócios por meio de certificado digital, ou então, da emissão de procuração a quem de direito, para formalizar a assinatura na forma proposta (evento 1, INIC1, p. 8).
Dessa forma, a apelada comunicou essa necessidade ao apelante em duas oportunidades distintas, sendo a primeira por WhatsApp em 14-1-2020 (evento 1, DOC3), e a segunda via e-mail, em 19-6-2020 (evento 1, DOC4).
Todavia, a comunicação não foi atendida adequadamente, tampouco a obrigação foi cumprida, embora esse ônus fosse do apelante, segundo o art. 373, II, do Código de Processo Civil (CPC).
O cumprimento dessa obrigação era necessário à conclusão do processo de registro da cessão na Junta Comercial, e recaía ao apelante. Inclusive, a própria cláusula décima primeira do contrato estabeleceu que as partes deveriam empreender esforços ao comparecimento em órgãos públicos para fins de formalização dos documentos, independentemente de notificação. No entanto, a obrigação não foi cumprida, situação que culmina na desobrigação da apelada em dar prosseguimento à transferência da cota social, pois lhe é juridicamente impossível, na fase em que o procedimento se encontra.
Consequentemente, segundo o art. 476 do CC, "Nos contratos bilaterais, nenhum dos contratantes, antes de cumprida a sua obrigação, pode exigir o implemento da do outro".
Assim, uma vez que o apelante deu causa à paralisação da regularização societária na Jucesc, não pode exigir a transferência da cota social e prosseguimento das regularizações junto à apelada. Consequentemente, se não pode reclamar do contrato sem antes cumprir com sua parte, não detém um título executivo de pleno direito, pois ausente o requisito de exigibilidade da obrigação, instituído no art. 783 do CPC.
Nesse sentido, este TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Apelação Nº 5009072-51.2020.8.24.0075/SC
RELATOR: Desembargador Substituto GIANCARLO BREMER NONES
EMENTA
DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE COTAS SOCIAIS. EXTINÇÃO DA EXECUÇÃO. DESPROVIMENTO.
I. CASO EM EXAME
1. Apelação contra sentença que acolheu embargos à execução e extinguiu execução de título extrajudicial. A execução buscava a transferência de cota social adquirida em contrato de compra e venda e o pagamento de multa contratual de 20% do valor avençado.
2. O apelante sustenta que a transferência da cota social consiste na regularização da propriedade do apartamento e box de garagem adquiridos. Alega que a execução está lastreada em título executivo hábil e requer o prosseguimento do feito executivo.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
3. A questão em discussão consiste em saber se é exigível a obrigação de transferência de cota social quando o próprio credor não cumpriu obrigação precedente necessária à conclusão do procedimento de registro na Junta Comercial.
III. RAZÕES DE DECIDIR
4. Nos contratos bilaterais com obrigações interdependentes, o contratante que não cumpriu sua obrigação não pode exigir da contraparte o cumprimento de obrigação subsequente, conforme o art. 476 do Código Civil.
5. A regularização da cessão de cotas na Junta Comercial depende da assinatura dos sócios por certificado digital ou da emissão de procuração. O exequente foi comunicado dessa necessidade em duas oportunidades e não atendeu adequadamente, descumprindo obrigação contratual precedente.
6. O ônus de comparecer em órgãos públicos para formalização de documentos era do exequente, conforme cláusula décima primeira do contrato, que estabeleceu o dever de comparecimento independentemente de notificação.
7. A inércia do exequente no cumprimento de sua obrigação tornou juridicamente impossível à executada dar prosseguimento à transferência da cota social, afastando a exigibilidade da obrigação e descaracterizando o título executivo extrajudicial.
8. Não havendo inadimplemento da executada por culpa exclusiva da inércia do exequente, a multa contratual também é inexigível.
IV. DISPOSITIVO E TESE
9. Recurso conhecido e desprovido. Majoração de honorários advocatícios em 2%.
Tese de julgamento: "Nos contratos bilaterais, o inadimplemento de obrigação precedente pelo credor inviabiliza a exigibilidade da obrigação subsequente do devedor."
_______________
Dispositivos relevantes citados: CC, art. 476 e art. 1.057; CPC, arts. 485, IV, e 783.
Jurisprudência relevante citada: TJSC, AC n. 5005362-33.2020.8.24.0007, rel. José Agenor de Aragão, Quarta Câmara de Direito Civil, j. 11-9-2025.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 3ª Câmara Especial de Enfrentamento de Acervos do decidiu, por unanimidade, conhecer da apelação e desprovê-la. Em cumprimento ao art. 85, §§2° e 11, do CPC, majoro os honorários fixados anteriormente em 2%, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 12 de novembro de 2025.
assinado por GIANCARLO BREMER NONES, Desembargador Substituto, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 6933613v4 e do código CRC fbe477b5.
Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): GIANCARLO BREMER NONES
Data e Hora: 13/11/2025, às 10:29:29
5009072-51.2020.8.24.0075 6933613 .V4
Conferência de autenticidade emitida em 16/11/2025 16:09:50.
Identificações de pessoas físicas foram ocultadas
Extrato de Ata EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL - RESOLUÇÃO CNJ 591/24 DE 11/11/2025 A 18/11/2025
Apelação Nº 5009072-51.2020.8.24.0075/SC
RELATOR: Desembargador Substituto GIANCARLO BREMER NONES
PRESIDENTE: Desembargador MARCOS FEY PROBST
PROCURADOR(A): MONIKA PABST
Certifico que este processo foi incluído como item 21 na Pauta da Sessão Virtual - Resolução CNJ 591/24, disponibilizada no DJEN de 27/10/2025, e julgado na sessão iniciada em 11/11/2025 às 00:00 e encerrada em 12/11/2025 às 16:06.
Certifico que a 3ª Câmara Especial de Enfrentamento de Acervos, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 3ª CÂMARA ESPECIAL DE ENFRENTAMENTO DE ACERVOS DECIDIU, POR UNANIMIDADE, CONHECER DA APELAÇÃO E DESPROVÊ-LA. EM CUMPRIMENTO AO ART. 85, §§2° E 11, DO CPC, MAJORO OS HONORÁRIOS FIXADOS ANTERIORMENTE EM 2%.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Substituto GIANCARLO BREMER NONES
Votante: Desembargador Substituto GIANCARLO BREMER NONES
Votante: Desembargador Substituto LEONE CARLOS MARTINS JUNIOR
Votante: Desembargador MARCOS FEY PROBST
CLEIDE BRANDT NUNES
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 16/11/2025 16:09:50.
Identificações de pessoas físicas foram ocultadas